Onde a magia acontece

MELHORES DE 2022: Séries [Terceiro Lugar]

| sexta-feira, 30 de dezembro de 2022
... TO BE CONTINUED »
Ano novo começando, e isso significa uma coisa muito importante. Mais importante que o especial de Natal do Roberto Carlos (isso existe ainda? Fica a questão), mais importante que o CD da Simone (ou Mariah Carey se vc for americano) tocando em loop dezembro inteiro, muito mais importante que isso. Estou falando, é claro, que chegou a época das premiações de melhores do ano!

E entre elas, é claro que uma em particular se destaca! Maior que o troféu imprensa, mais tecnica que o Prêmio Puskas, mais polemica do que o bancário do ano pela FEBRABAN do Acre... estou falando, é claro, da minha lista de melhores de 2022!

Agora, apenas para lembrar, essa lista se refere ao que eu assistir em 2022, não necessariamente o que saiu esse ano. Se algo saiu em anos passados e esta aparecendo na lista desse ano, azar é do goleiro, eu assisti o que eu assisti. E se vc tem algum problema com isso, bem, eu não fico me metendo em como você organiza as suas listas de melhores do ano!

EU NÃO ACHO QUE MAIS NINGUÉM VAI ANOTANDO O QUE FEZ DURANTE O ANO PARA DEPOIS FAZER UM POST QUE APENAS 10 PESSOAS VÃO LER, NUMA PERSPECTIVA TOTALMENTE FORA DA REALIDADE DE OTIMISTA. CHAMA-SE TER UMA VIDA, SABE?

Não, não posso dizer que o conceito me seja familiar...

SUSPEITEI DESDE O PRINCIPIO...

Hã, seja como for, vamos aos trabalhos e os indicados desse ano a categoria MELHOR SÉRIE 2022 são...

  • Doctor Who (arco da 13a Doutora) 
  • Hawkeye
  • The Witcher
  • Peacemaker
  • Dark
  • Moon Knight
  • Babylon 5
  • Halo
  • Obi-Wan Kenobi
  • Ms. Marvel
  • The Boys
  • The Sandman
  • The Expanse
  • Stranger Things
  • Tales from the Loop
  • Andor
Então, sem mais delongas e mistérios, o terceiro lugar e medalha de bronze vai paraaaaaaa...


Durante muitos anos, especialmente durante o grande boom das adaptações de quadrinhos para o cinema - especialmente com os sucessos bilionários da Marvel - sempre houve um sonho (viram o que eu fiz aqui, hã, hã?) de adaptar as maiores obras dos quadrinhos para a tela grande.

Quando se fala das maiores obras dos quadrinhos, poucas coisas são realmente maiores do que o cara que te faz ficar com remela nos olhos a noite (essa "areia" é da onde vem o "sandman" ser o senhor dos sonhos, não confundir com o inimigo do Homem-Aranha que acha que fazer cosplay de Freddy Krueger é o último grito da moda). E a outra coisa que se falava é que simplesmente não podia ser feito.

Sandman foi chamado de "infilmavel" e "inadaptavel" mais vezes do que eu tive match no Tinder...

NÃO FORAM TANTAS ASSIM, ENTÃO...

Fato, escolha infeliz de exemplo. Ainda sim, vcs pegaram a ideia. Mas pq, de todas as coisas, essa serie era areia demais para o caminhãozinho (viram o que eu fiz de novo? To on fire hoje, yo!) do cinema e da televisão? De forma bastante simples, devido ao seu maior ponto forte: o seu texto. O que faz Sandman ser realmente especial, o que faz Sandman ser Sandman é a qualidade do texto de Neil Gainman, as ideias que ele passa. Como o seu protagonista, Sandman é mais para poesia onírica do que um cara com super poderes socando bandidos, é sobre ideias maiores do que a vida, maiores do que deuses. Quer dizer, a história é sobre o Sonho (não um cara com poderes de sonhos, literalmente a personificação do conceito) e seus irmãos Destino, Delirio, Morte, Desespero... vc pegou a ideia. Essa é uma história é sobre... sonhos, em todos os sentidos das palavras.

O que, nos quadrinhos, é muito bonito. Especialmente com a arte de uns desenhistas que tavam virados no Jiraya pra vender essa ideia daquele estado de semiconsciencia entre o acordado e o dormindo. Desncessário dizer que funciona. Muito. Nos quadrinhos.



O problema começa na hora de adaptar isso para uma midia mais visual. Sério, eles vão fazer como? Dois caras sentados num banco conversando por 45 minutos, durante 10 episódios ou um filme de 2 horas? Tá, o Tarantino de fato coloca cenas de 20 minutos de apenas personagens conversando, e é muito foda, mas é pq ele é o Tarantino e só existe um Tarantino.  Se as suas chances de uma jogada dar certo é dizer "mas o Pelé consegue fazer" e vc não tem o Pelé (descanse em paz, GOAT) para faze-la... as chances dela dar certo não são muito grandes.

Não é que Sandman não tenha cenas de ação, mas a obra não é sobre isso. A obra é sobre ideias, sobre conceitos... e isso não combina bem com o cinema e menos ainda com a TV, onde a disputa pela atenção de um mundo que sofre generalizadamente de TDAH é cada vez mais brutal.

Então por esses motivos, durante muito e muito tempo se disse que Sandman não podia ser adaptado. Até que foi. E muito bem. Mas como?

Bem, algumas coisas deram certo aqui. Primeiro, que o criador dos quadrinhos, também trabalha com roteiros (escrever livros e escrever roteiros para TV são dois trabalhos completamente diferentes e ser bom em um não quer dizer que vc sequer saiba como fazer o outro). Em segundo lugar, ele teve bastante experiencia com as adaptações bem menos felizes dos seus outros trabalho (Deuses Americanos e Good Omens), e aprendeu bastante sobre o que NÃO fazer. Com efeito, ele disse em uma entrevista a IGN que para adaptar Sandman teria que ser feito por alguem com a obsessão que Peter Jackson tem com Senhor dos Aneis ou Sam Raimi com o Homem-Aranha. Isso é um começo sólido, definitivamente, mas não explica tudo.

O que a série realmente faz é adaptar as ideia para um formato que funciona melhor na TV. Isso quer dizer duas coisas: primeiro, que os dialogos são convertidos em cenas visuais tão oniricamente quanto possivel, mas sem esquecer que é para quem está assistindo na TV entender. Isso é mais dificil de fazer do que falar, mas quando é bem feito... bem, temos cenas como a disputa do Sonho com Lucifer, é uma cena que eu vou lembrar por muitos e muitos anos.


A outra coisa que torna Sandman mais palatavel para a televisão é que o nosso (não) herói tem um arco de personagem mais definido. Morfeu, o senhor dos Sonhos, vulgo Sandman, é um dos Eternos. Entidades-conceitos tão antigas quanto (ou mais) do que o próprio tempo. Isso quer dizer que ele não é "um cara", ele é uma figura alienigina que por acaso tem uma forma humana pq senão virava Lovecraft saporra. Ainda sim, ele claramente não é um de nós - e isso é um elogio, é muito dificil a televisão ou o cinema fazer um alien que não seja apenas um "humano com pele colorida", ter uma forma de pensar e valores realmente alienginas é algo muito dificil de escrever pq... bem, pq a gente não tem nada do tipo para comparar, a unica cultura que a gente conhece é a humana.

Porém depois de passar 70 anos aprisionado entre os humanos, 70 anos esses que seus irmãos só mandaram um "tomate cru é vitamina" pra ele, Sandman começa a considerar a ideia que os seus irmãos são meio cuzões e que os humanos, por todas as merdas que nós fazemos... bem, nós estamos tentando fazer o melhor que podemos com as ferramentas que nós temos. Isso não quer dizer que ele vira o melhor buddy-buddy da humanidade, mas o processo de ver uma figura alien aberrante começar a questionar a forma com que ele fazia as coisas é deveras interessante de assistir.

E claro, adicione a isso as ideias realmente criativas de Gainman sobre como explorar as várias facetas do sonho através de contos isolados (eu particularmente gosto do episódio sobre os gatos, é um exemplo perfeito do que faz Sandman ser tão bom) e temos uma série muito interessante de assistir.

SE É TÃO INTERESSANTE... PQ ESTÁ APENAS NO TERCEIRO LUGAR?

Então... mas, porem, todavia, contudo... isso é realmente curioso que o ponto fraco da série não é quando ela tenta adaptar as ideias mais fora da casinha dos contos sobre sonhos (como o episódio da lanchonete, aquilo é realmente ótimo, ou o episódio que ele dá um role com a irmã em um dia de trabalho da Morte), o problema é quando ela adapta o que é mais normal.

Os arcos narrativos que não são episódios isolados, e ironicamente mais faceis de adaptar para a televisão, são bastante... bem, desinteressantes - em especial o arco final da série, eu achei beeeem marromenos. Sandman funciona em seu melhor quando está sendo estranho, quando ele tenta emplacar uma jornada do herói comum... bem, isso é comum. 

O que eu quero dizer é que é meio que nem nos filmes do Godzilla que sempre tem alguns humanos com seus draminhas pra dar tempo de tela (pq o filme não pode ser 2 horas de maquetes sendo pisadas) e com os quais ninguem se importa pq a gente assiste o Godzilla pra ser o Godzilla godzillamente, não aquela gente que eu não ligo. Sandman funciona de forma bem parecida, ele precisa ser esquisito e estranho para funcionar - funciona quando é... mas não o é o tempo todo. Ergo, terceiro lugar.

MELHORES DE 2022: Séries [Terceiro Lugar]

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POSTADO EM:sexta-feira, 30 de dezembro de 2022
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Melhores de 2021 [GAMES]

| sábado, 12 de fevereiro de 2022
... TO BE CONTINUED »

Essa lista se refere a tudo que eu joguei em 2021, não necessariamente o ano que foi lançado.

Essa lista demorou um pouco mais que o normal, porque eu queria fazer direito e videogames são uma parte bastante grande do meu tempo. Como é algo que eu vou fazer só uma vez por ano, acho que vale a pena o esforço.

Dito isso, vamos ver então os candidatos - ou seja, tudo que eu joguei durante o ano de 2021:

  • Final Fantasy XIV - Heavens Ward
  • Doom Eternal
  • Behold the Kickmen
  • Carrion
  • Neoverse
  • Control
  • Donut County
  • The Medium
  • God of War (2018)
  • Code Vein
  • Wreckfest
  • Octopath Traveler
  • FIFA 20
  • Mass Effect Andromeda
  • Rain on Your Parade
  • Detroid Become Human
  • Katana Zero
  • A Way Out
  • Dishonored
  • VA-11 Hall-A
  • Yakuza: Like a Dragon
  • Gone Home
  • Katamary Damacy Reroll
  • Hades
  • 12 Minutes
  • Psychonauts 2
  • Destroy All Humans
  • Into the Breach
  • Sable
  • Scarlet Nexus
  • Marvel Avengers
  • Outriders

BRONZE: Scarlet Nexus

Se tem algo que eu instintivamente desenvolvi aprendi a fazer ao longo dos anos jogando videogames... é ignorar os jogos anime-like da Bandai Namco. Não é nem que os milhares de "Tales of" da vida e afins sejam ruins, eles apenas não são muito bons também. São apenas okay-ish. Legalzinho.

E se um jogo me exige 60, 100 horas da minha vida, eu espero mais dele do que ser apenas "legalzinho". A vida é curta demais pra você investir 60 horas dela num jogo que é basicamente um anime medíocre (no sentido literal da palavra, de mediano). Então, suponho que não seja muita surpresa que quando Scarlet Nexus foi mostrado na E3, minha reação foi apenas "ah, outro daqueles jogos de anime da Bandai Namco... eu vou na cozinha pegar alguma coisa pra comer enquanto passa isso".

https://youtu.be/acOHLHBRqpM

Ignora, vida que segue. Mas aí então em outubro estava para entrar no Gamepass o jogo dos Vingadores, que é um que eu queria jogar, e no dia que o jogo deveria entrar atrasou por qualquer motivo que seja. Como eu tava com um tempo livre, decidi baixar esse joguinho da Bandai pq pelo menos o combate parecia passável. Mas era só pra ver mesmo, depois de algumas horas eu desinstalava. Ou pelo menos foi o que eu achei...


O combate nesse jogo... é o melhor que eu já joguei em qualquer hack'n slash na vida. Se você já jogou Devil May Cry 5 ou Metal GEar Revengeance ("revingança" é um nome muito legal, hehe) vai entender o que eu estou falando: quando um jogo desse genero é bom existe um fluxo, um ritmo, uma forma como as coisas fluem e a sequencia de golpes é apenas... harmoniosa.
Pode ter um bilhão de coisas acontecendo na tela (e normalmente tem), mas no seu cerebro as coisas funcionam com uma organização que é quase como se o tempo desacelerasse, você entende onde está cada elemento, você entende quais são os alcances dos seus movimentos, a coisa apenas ... flui, sabe?

Alguns jogos, alguns EXCELENTES jogos (como eu já citei, DMC 5 ou o Metal Gear do Rayden) fazem isso... mas Scarlet Nexus vai um passo além. Isso porque além do combate com espada, seu personagem tem poderes psiquicos e isso é integrado ao combate lindamente. Pense em Control (mais sobre isso daqui a pouco), mas eleve ao 11 na escala anime (em um bom sentido). O combate aqui é realmente bom e realmente fluído... mas aí a Bandai vai e adiciona mais cheddar na borda da pizza: variedade.

Isso porque não é apenas seu personagem que tem poderes psiquicos, você pode escolher três membros da equipe para te acompanhar, cada um com seus próprios poderes. Enquanto a sua coisa é obrigatoriamente telecinese (e é muito divertido arremessar um carro nos inimigos no meio do combo, ou arrancar uma viga de concreto do chão e passar a limpa), seus companheiros tem poderes mais variados que vão desde ataques elementais (fogo, eletricidade, etc) a coisas mais utilitarias como desacelerar o tempo ou detectar inimigos invisiveis. Pense em X-Men, ou para manter a estética de anime, Boku no Hero Academia. Isso tudo é, obviamente, muito divertido.

Eu acho particularmente impressionante em como a Bandai resolveu o problema de gerenciar tanta informação ao mesmo tempo: não apenas os seus ataques telecinéticos levam tempo para recarregar, como o dos seus companheiros e ainda tem comandos especificos que você pode fazer no meio dos combos. Para resolver isso a edição de som desse jogo é algo que eu nunca tinha visto (bem, ouvido) na vida e metade do jogo você se guia pelos efeitos sonoros. É um deleite para os sentidos.

Agora o que me chamou atenção nesse jogo pelo menos tanto quanto o combate ser realmente estelar... é que a "história mediocre de anime genérico" dos jogos da Bandai... não é realmente medíocre nem genérica. É um cenário muito bom com uma história interessante, na verdade, e eu realmente não esperava isso. Por exemplo, os membros aposentados da OSF têm problemas para se ajustar à vida civil depois de deixar a organização. Há também um segmento da população que nasceu sem poderes psiônicos e, portanto, é desprezado como cidadãos de segunda classe. Existem temas de classismo, habilidade e discriminação no jogo que eu definitivamente não esperava esse tipo de construção de mundo.

https://youtu.be/nOumLAM7ByI
[Tá, e essa abertura do jogo ser espetacular e eu não ter conseguido pular uma única vez também ajudou]

Mais importante que isso, a explicação do que são os monstros bizarros (como buques de flores com pernas, que aparece no trailer) e da onde eles vem, ou o que são as red strings que dão nome ao jogo... é uma história realmente criativa, saiba você. Scarlet Nexus tem um elenco colorido de personagens (tá, muitos deles são clichês de anime, mas a esse ponto o jogo se conquistou o direito de ser um pouco cliche) e uma impressionante variedade de mecânicas de jogo, mas para mim, a cereja do bolo inesperada é a sua história. Os capítulos são muito bem ritmados, e nenhum deles se arrasta mais do que deveria.

Para um jogo que eu não esperava absolutamente nada, foi um dos jogos mais divertidos do ano.

PRATA: Control


Okay, eu vou começar esse texto dizendo uma coisa obvia que você já sabe - o que por tabela vai te fazer sentir inteligente ao já saber isso: fazer videogames é muito caro. Tipo, muito. Para fazer um jogo AAA (triplo A é como são chamadas as superproduções blockbusters dos jogos) você precisa pagar uma equipe de 100, 200, as vezes 300 pessoas durante meses a fio, mais frequentemente durante anos.

E durante esses anos você não apenas não ganha nada pra bancar essa brincadeira (exceto pré-vendas, mas isso depende muito da popularidade da marca ou dos envolvidos), como não tem certeza nenhuma se o projeto vai dar algum retorno. Ou seja, não apenas é um negócio muito caro como muito, muito arriscado.

E por que eu estou falando isso? Porque eu preciso que você entenda o cenário de como se banca a produção de um VIDJAGUEIME para entender que as desenvolvedoras dos grandes jogos não curtem muito correr riscos. Assim é apenas natural que os grandes jogos multimilionários ocidentais (o Japão, como de costume, é sua própria coisa e funciona por suas próprias regras) não são realmente ousados e é por isso que vemos tantas continuações ou jogos "seguros", como o bilionésimo Space Marine atirando em monstros cinzentos, ou o trilionésimo nono jogo sobre a segunda guerra mundial. Ou então jogos sobre propriedades intelectuais já consagradas que vão vender bem mesmo que o jogo seja feito com duas caixas de ovos sobre um tamagochi na chuva.


E quer saber? Eu entendo. Se fosse os MEUS milhões, eu também teria brotoeja só de pensar em correr riscos. As pessoas vão comprar "SOLDADO MACHÃO VENCENDO A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL SOZINHO VIII" com certeza absoluta? Então faz essa porcaria e não me inventa frescura!

Então, é, eu entendo. O que não quer dizer que eu goste da forma que as coisas estão. Sim, verdade que os estudios indies tem ideias criativas a dar com pau todos os dias ao ponto que você nem consegue mais acompanhar de tanto jogo que sai (de certa forma eu sinto falta um pouco das revistas de videogames, os textos geralmente eram toscos mas a curadoria seria util hoje pq é muita oferta e vc nem sabe por onde começar... mas divago). Mas as vezes, apenas as vezes, eu gostaria que algumas dessas ideias fosse realizadas com orçamento maior do que o de três Mandolates comprados na sinaleira 3 por 5 reais.

TÁ, LEGAL, MAS TU VAI CHEGAR A ALGUM LUGAR COM ISSO?

Claro que vou, voz ficticia narrativa colocada aqui apenas para eu fingir que tenho com quem interagir. O meu ponto é que tudo isso que eu disse era o cenário de games em 2019... e nada disso realmente se aplica muito a Remedy. A Remedy, saiba você, é uma desenvolvedora finlandesa de jogos que faz uma coisa que eu preso muito, muito mesmo em videogames e na vida em geral: eles se permitem serem estranhos, eles se permitem correr riscos. E isso é de um valor inestimável.

Depois de fazer uma quantia razoavelmente segura de dinheiro com um jogo relativamente normal (Max Payne), uma vez que eles podiam se dar ao luxo eles se permitiram tentar outras coisas - e coisas estranhamente deliciosamente estranhas. Seu jogo mais famoso após Max Payne, por exemplo, é... basicamente um walking simulator que é a melhor história imersiva de Stephen King que Stephen King nunca escreveu. Sério, se o seu sonho sempre foi andar dentro de um conto de Stephen King... ajuda médica profissional deve ser consultada, mas fora isso você quer jogar Alan Wake. E como nunca realmente tivemos um jogo de Twin Peaks, isso é o melhor que dá pra encontrar.

https://youtu.be/cF_YGL3W6CE

O próximo jogo da Remedy foi mais ambicioso ainda, e a Microsoft diz que foi a IP original mais bem vendida do Xbox One: uma ideia original de fundir série de televisão com videogame. E viagens no tempo, obviamente. Quantum Break. 

https://youtu.be/ruY1eT9bXiw

Então eu suponho que deu pra entender que a Remedy não tem muita vergonha de ser estranha. Agora, enquanto a estranheza de suas ideias e ambientações é algo a ser louvável... o gameplay não era exatamente seu ponto forte nos ultimos anos. Quer dizer, Alan Wake é atmosférico e interessante pacas, mas ele é mais um walking simulator do que qualquer outra coisa. Quantum Break tem ideias interessantes (algumas que nunca tinham sido tentadas a essa escala, com certeza), mas o combate é apenas... passável.

Mas então imagine, apenas imagine, se então eles conseguissem juntar os dois: uma ideia do tipo "caraca maluco, que que esses caras andaram fumando?" com um gameplay que estala de tão refinado? Esse seria Control.

Descrevendo no papel, Control é um metroidvania que se passa na Oldest House, um prédio de arquitetura brutalista no coração de Nova York e que também é uma falha interdimensional nas horas vagas. Nas mãos de alguém menos criativo isso seria basicamente um ripoff de Resident Evil: okay, você tem uma grande locação onde coisas estranhas acontecem. Seria, mas então a Remedy fala estranhês fluentemente demais para ser só isso.

O resultado é Control é meio que como um grande episódio de Twilight Zone (ou "Alem da Imaginação", no Brasil) onde cada area do prédio meio que causa uma sensação de "é o que, meu amigo?", que varia desde o apenas "hã, estranho" (como o patinho de borracha mantido em uma zona de quarentena máxima) até vislumbres de abominações lovecraftianas que apenas podemos torcer para que nunca prestem atenção realmente na nossa frágil Realidade.

Control não é exatamente tímido a respeito das suas influências. Há referências claras a nomes (além do próprio Twilight Zone) como  Lost, Twin Peaks e House of Leaves. A bricolagem de resultante de tudo isso é tremendamente satisfatória, sentindo sua própria coisa ao invés coesa, seu próprio tom, sua própria atmosfera mais do que ser apenas uma coleção de referencias.

Tudo funciona porque, diferentemente de qualquer uma dessas inspirações mencionadas, Control é um videogame. E os videogames, mais do que qualquer outro meio, são especialmente adequados ao conceito de um personagem desenterrando informações sobre um assunto fascinantemente misterioso. Control é um jogo que passa a maior parte de seu tempo de execução colocando você em blocos de escritórios sombrios, mas todos os computadores empoeirados e cubículos  abandonados em cada escritório contam a história de algo muito estranho que aconteceu ali.

Mas o que torna Control realmente diferente, como eu disse, é que ele não é um walking simulator e sim um jogo de ação. Ele começa como um jogo de tiro bem básico, porém conforme você vai avançando vai desbloqueando habilidades psiquicas e é aqui que as coisas ficam realmente loucas: misturar um jogo de tiro definitivamente competente com poderes de X-Men, da forma que foi feito, é uma das coisas mais divertidas da história dos videogames.

Diabos, com efeito a luta no Ashtray Maze em que você está no pleno uso dos seus poderes (tanto em desbloquear habilidades, como 100% acostumado ao gameplay do jogo aquela altura) é a melhor cena que eu já joguei em um jogo na vida. Ponto. É tiro, porrada e bomba voando pra todo lado, você usando 100% dos seus poderes psiquicos no modo full Akira, o próprio espaço-tempo se retorcendo e desdobrando ao seu redor enquanto um bom e velho metal nórdico rola em sincronia com as suas ações... chega a dar um quentinho no peito só de lembrar.

Control é como se o melhor da ação de Max Payne e a atmosfera de Alan Wake fizessem um pornô juntos e pedissem a Stanley Kubrick para dirigi-lo. É um jogo esquisito que não tem vergonha de correr riscos, e sua coragem é recompensada com um cenário repleto de momentos "eita porra Giovanna..." e um combate divertidissimo pacas.

OURO: Psychonauts 2

Okay, essa é uma pergunta interessante: eu acabei de cantar louvores em prosa e verso a como Control é um jogo espetacular em tudo ele tenta fazer: o combate é macetante, o cenário é espetacular e a apresentação em estética e som é algo do qual os videogames devem se orgulhar.

Como, então, algo pode ser possivelmente melhor que isso? A resposta é bem simples: não pode.

HÃ, VOCÊ SABE QUE ESSA HIERARQUIA NA APRESENTAÇÃO TEM UM SENTIDO, NÉ? SE É SÓ PRA COLOCAR EM QUALQUER ORDEM ALEATORIA ESSES POSTS NÃO TEM MUITO SENTIDO REALMENTE...

Sim, eu sei. Eu sei que eu sou louco (tanto que estou discutindo com uma voz narrativa na minha cabeça), mas não sou TÃO louco. O que eu quero dizer é que Psychonauts 2 não é melhor que Control pra mim porque ele faz coisas de uma forma melhor - com efeito, dificilmente eles tentam fazer as mesmas coisas. Ele é melhor pra mim porque as coisas que ele faz bem são mais importantes.

E o que possivelmente pode ser mais importante do que gameplay e ambientação? A experiencia como um todo, e isso Psychonauts 2 não tem comparação.

Veja, se tem algo que eu respeito muito em uma obra é quando ela é projetada para ser feita usando as forças de uma midia em particular ao ponto que adapta-la para outro formato não é algo que possa ser feito sem grandes perdas a ideia.

Por exemplo, HP Lovecraft trabalhava muito em seus livros mais com fragmentos ideias do que descrições sólidas das coisas - o que é todo o ponto da obra, que a mente humana não consegue realmente compreender o que são os Old Ones sem se liquefazer no processo porque é uma coisa tão colossal, tão antigo, tão alienígina, tão maligna que nós nem somos fisicamente capazes de processar isso. E isso funciona com descrições vagas e escrita de um jeito que deixe a mente do leitor preencher os pontos da forma que lhe convir. Transformar numa experiencia visual como um filme... hã... até pode ser feito, mas precisa de tanto esforço e tantos saltos laterais que o diretor que fizer isso pode sair direto do estudio para se alistar no Cirque Du Soleil.

E, ainda nesse tema, eu particularmente amo videogames que precisam necessariamente serem videogames para funcionar da forma que funcionam. Grande parte do charme de Dark Souls, por exemplo, vem da narrativa ambiental contada pelo seu cenário. Não é pelas cutscenes (que não existem no jogo), mas toda a experiencia é permeada por uma sensação melancólica de que aconteceu uma história naquele lugar e apenas você chegou tarde demais para testemunha-la acontecendo. O feeling é passado pelo level design, pelo som (ou pela falta dele) e pela própria dificuldade do jogo que é parte indissociavel da experiencia emocional da obra. É uma coisa bem única, e embora eu não digo que seja proibido um diretor de cinema emular essa sensação ... bem, boa sorte com isso. Você vai precisar.

E esse é o ponto que torna Psychonauts 2 tão especial: as suas ideias, as suas sensações, o que ele quer te dizer enquanto obra... só funcionam dessa forma em particular porque é um videogame. Curiosamente, o primeiro Psychonauts saiu para PS2 em 2005, o mesmo ano em que Shadow of the Colossus deu aula, curso completo e pós-doutorado em como transformar um jogo em uma experiencia artística, profunda e visceral usando apenas elementos de gameplay.

Embora não tão laureado quanto, psiconautas foi um aprendiz digno dessa escola de game design. Sua fusão de narrativa com mecânica de plataforma e a maneira como sua história justificava a jogabilidade. A desenvolvedora Double Fine - líderada por Tim Schaffer (que já havia provado ser um cara fora da curva com seus point'n click da Lucas Arts) - criou um jogo de plataforma que, mais do que ser um brinquedo a ser vencido, queria dizer alguma coisa a um nível pessoal. Era um jogo sólido enquanto jogo, mas tambem era otimista e sensível. 

Dezesseis anos depois, o cenário dos videojogos era muito diferente de 2005. Hoje não é realmente tão dificil encontrar jogos sólidos, porém otimistas e sensiveis, e para chamar atenção no cenário atual eles teriam que pensar mais alto, mais ambicioso, maior. 

E foi o que eles fizeram majestosamente.

A ideia do jogo original era sobre viajar na mente das pessoas, daí o nome Psychonautas, mas em 2021 isso foi elevado a todo o potencial que a ideia pode ter. É uma coisa sutil, mas o equilíbrio entre humor nonsense e tocar em questões profundamente pessoais deu um grande passo à frente. O jogo aborda questões sérias como alcoolismo, culpa, perdão, violencia doméstica, síndrome do panico e muitos outros, mas nunca se sente pesado demais por esses temas - nem leviano demais. É uma elegancia bastante única.

Todo estágio que mostra se apresentar em um show como uma metafora para síndrome do panico é de uma elegancia e sensibilidade que poucas vezes eu vi na vida. Quando você está em um game show de culinária com mecanicas criadas exclusivamente pra aquela fase, ou quando está em um hospital-cassino (sim), você não está apenas jogando fases ridiculamente (as vezes no sentido literal) criativas, você está abordando questões muito maiores do que isso e o que ela representam metaforicamente dentro da cabeça daquela pessoa.


[Um dos inimigos do jogo é o Mau Humor, que como na vida real precisa ter sua fonte encontrada para ser derrotado. Esse é apenas um inimigo regular, as lutas de chefes vão mais fundo que isso]

Isso tudo, e essa é a parte importante aqui, não é feito através de cutscenes, dialogos nem nada. É feito através como as fases são construídas, é como as plataformas são posicionadas e como elas parecem. Sim, Psychonauts conta uma narrativa emocional através de pular plataformas e lutas com chefes. Entende agora o que eu quis dizer com esse jogo PRECISA ser um jogo para chegar onde ele quer chegar?

Além, claro, de que mesmo que você ignore tudo isso e apenas jogue o jogo... bem, ele é um jogo solidamente bom. Um dos velho estilo de plataforma 3D dos dias do Nintendo 64, só que atualizado para as necessidades modernas e com um combate inenarravelmente melhorado (o combate e a movimentação que justamente são meio tronchos no primeiro jogo), upgrade de habilidades, all the good VIDJAGUEIME stuff. Isso, é claro, o humor fora da casinha de Tim Schaffer.


Se fosse apenas um jogo de plataforma, Psychonauts 2 seria inegavelmente um grande jogo. Mas ele é mais ambicioso que ele isso, é um jogo que quer acima de tudo ser uma obra de arte, que tocar em um ponto. E eu acho que consegue espetacularmente.

Psychonauts 2 é mais do que um jogo, é uma fodenda obra de arte.

Melhores de 2021 [GAMES]

THE STORY SO FAR: Essa lista se refere a tudo que eu joguei em 2021, não necessariamente o ano que foi lançado. Essa lista demorou um pouco mais que o normal,...
POSTADO EM:sábado, 12 de fevereiro de 2022
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Melhores do ano 2021 [ANIMAÇÃO]

| terça-feira, 8 de fevereiro de 2022
... TO BE CONTINUED »


Essa lista se refere a tudo que eu assisti em 2021, não necessariamente o ano que lançado, e ela engloba tanto séries quanto longa metragem. Sim, ontem mesmo eu fiz uma lista sobre anime e essa é sobre animações em geral porque enquanto anime tecnicamente É um desenho animado também... qual é, vocês sabem que é uma coisa diferente que funciona com regras diferentes, uma filosofia diferente e tem todo um zeitgeist próprio. Então vocês entenderam do que eu estou falando, não seja essa pessoa do "mas tecnicamente..." pq ninguém gosta do cara do "mas tecnicamente" - essa dica de vida foi de graça, para as próximas arrasta pra cima e se inscreva no meu curso.

Dito isso, vamos ver então os candidatos - ou seja, todas animações que eu assisti durante o ano de 2021:
  • Avatar: A Lenda de Korra
  • Star Wars: Clone Wars
  • The Amazing World of Gumball
  • The Dragon Prince
  • Reboot
  • Soul
  • An American Tail
  • The Lion King 3: Hakuna Matata
  • Beavis and Butt-Head Do America
  • Wakko's Wish
  • The Pagemaster
  • Over the Moon
  • A Shaun the Sheep Movie: Farmageddon
  • Batman: Mask of the Phantasm
  • Raya e o Último Dragão
  • My Little Pony: A New Generation
  • Arcane
  • Wolfwalkers
BRONZE: Avatar: A Lenda de Korra


Tendo assistido The Last Airbender em 2020, uma das primeiras coisas que eu fiz em 2021 foi assistir a sua continuação. Então vamos começar tirando o elefante branco do meio da sala: Avatar: The Last Airbender é uma animação perfeita. Pronto, eu falei, tae, tá dito.

E o que eu quero dizer com "perfeito"? Bem, sempre que você assiste alguma coisa, mesmo uma que você goste muito, geralmente lhe ocorre alguma coisa que você gostaria que fosse feita diferente, alguma coisa que você mudaria pra ficar melhor ao seu gosto. As vezes nem precisa ser uma coisa grande, tipo Pacific Rim é um dos meus filmes favoritos da vida porque é a porra de robozão da porra dando com um navio petroleiro na cara de um kaiju, o que poderia ser melhor? Hã, eu faria com que houvesse uma explicação melhor do pq eles precisam usar robozões gigantes ao invés de apenas disparar misseis (um campo de força contra projeteis já resolveria a questão). Viu, nem precisa ser uma coisa grande, só um detalhezinho de nada que eu faria diferente.

Isso sendo dito, o que eu mudaria em The Last Airbender é... nada, realmente. Não me ocorre nada que eu gostaria que fosse diferente, ou melhor executado. Nada mesmo, é incrível e maravilhindo do jeito que é. Tá, pra não dizer que eu não mudaria nada naaaaada, eu gostaria de um final mais longo. Um episódio que fosse pra mostrar como ficaram as vidas deles após a batalha final.

Como eu falei do mesmo problema com o final do MCU em Avengers Endgame, como você continua uma coisa que é incrível, maravilhosa e estupefaçante no coração de todos? É uma tarefa deveras complicada, alguns diriam impossível. Mais complicado que isso ainda: muita gente vai ficar ofendida por você ao menos tentar porque o ser humano é um cabeça de mamão por natureza.

E esse foi o truque que os desenvolvedores do show se tocaram: não existe mortal pra trás, pirueta ou cambalhota que eles possam fazer que impeça a comparação de qualquer coisa que eles fossem fazer com sua obra anterior. Não tem como, é impossibiru. Então o que você faz? Super simples, não bata de frente com o ódio, use-o a seu favor o incorporando na narrativa, seja um hatebender. É uma ideia louca e ousada, mas eu tenho um fraco por ideas loucas e ousadas, saiba você.

Então o que rola nesse desenho é o seguinte: não tem como comparar Korra com Aang, e em qualquer aspecto o nanico careca sempre vai vencer. É muito fácil simpatizar com Aang: ele tem uma história trágica (literalmente todos que ele conheceu e amou na vida foram chacinados), e ainda sim tenta ser a melhor pessoa que ele pode ser. Ele não é perfeito nisso - apesar de ser um monge ele ainda é humano, mas ele tenta.

Korra por outro lado é o oposto disso, é muito difícil gostar: é uma menina impulsiva e mimada, que sempre ganhou tudo que quis na vida sem lá grandes esforços. Tudo sempre foi fácil pra ela e ela sempre teve o melhor sem dificuldade. Se alguma coisa, sua relação com a Korra no começo da série é que ela tropece num Lego e leve um tombo enquanto tá com as mãos no bolso.

E esse é o truque aqui: não é apenas a audiencia assistindo o programa que vai sempre comparar os dois, as pessoas vivendo naquele cenário também vão fazer o mesmo. O que não é sem razão, porque a Korra começa a série como uma babaquinha de marca maior.

Então o que Korra possivelmente poderia fazer para ser digna de ser colocada no mesmo nível do maior avatar (e metanarrativamente, do desenho animado) de todos os tempos? Perder tudo, simples assim. E eu quero dizer tudo mesmo: não apenas seus poderes, mas o seu próprio corpo.

Ao longo de sua jornada, Korra foi quebrada ao ponto de não restar absolutamente nada da sua pessoa. Sua alma foi dilacerada (e no caso de ser o avatar, isso não é figura de linguagem, foi literal mesmo), ela foi torturada, e passou os anos seguintes traumatizada e com dores cronicas (o que é não é uma sensação nada agradável, eu espero que você nunca passe por isso).

Ou, caso você não lembre, é assim que a terceira temporada termina:


Yaicks, isso é... pesado. Eu não lembro agora, de cabeça, de nenhuma animação onde termina com o protagonista chorando calado em uma cadeira de rodas. Talvez porque nunca foi feito...

Animextremist - Imagenes de Saint Seiya Tenkai Hen Overture

Carai Kurumada, não ferra com o meu argumento cara... CAHAM, mas prosseguindo...

Seja como for, isso também é uma coisinha que se chama "arco de personagem". Apesar de começar a série com controle de todas as dobras, Korra não realmente faz ideia do que ser o Avatar significa e definitivamente não merece ser chamada de um e todo ponto da animação e ela tem que fazer fazer essa jornada de perder tudo a aprender o que ser o Avatar significa com todo mundo chovendo na cabeça dela o tempo todo que ela nunca vai ser tão boa quanto o Aang.

Isso também é uma coisinha que se chama "arco de personagem". Apesar de começar a série com controle de todas as dobras, Korra não realmente faz ideia do que ser o Avatar significa e definitivamente não merece ser chamada de um e todo ponto da animação e ela tem que fazer fazer essa jornada de perder tudo a aprender o que ser o Avatar significa com todo mundo chovendo na cabeça dela o tempo todo que ela nunca vai ser tão boa quanto o Aang.


É uma escolha de design narrativo muito interessante, e eu genuinamente acho que é uma experiencia rica a série ser feita dessa forma. Outra coisa que eu gosto bastante nessa série é que todos os vilões querem coisas que são essencialmente boas, só que de uma forma distorcida.


Igualdade, espiritualidade, liberdade e união podem ser ferramentas do mal (e por mal entenda algo que faz as pessoas sofrerem) se forem feitos fora do equilíbrio. Essa é uma mensagem muito mais profunda do que “acredite em si mesmo”, ou qualquer merda do tipo que normalmente temos nos desenhos animados normalmente.

E enquanto tudo isso é incrível e faz o show realmente valer a pena de se assistir... não é sem sua dose de problemas. E não é uma pequena, saiba você. A história de produção do show teve vários, vário, vaaaaaaaaarios problemas com a Nicklodeon ao ponto que os produtores não sabiam nem quantos episódios eles iam poder ter ENQUANTO A SÉRIE ESTAVA SENDO FEITA. Tente escrever um livro sem ter controle de quantas páginas ele vai poder ter e depois me diga o quão bem isso se sai.

O resultado foi que a construção de mundo, em que criar um cenário interessante de fantasia foi o ponto mais forte de Avatar, foi relegada a algumas ideias de se basear na Nova York dos anos 20 na primeira temporada e... meio que termina por aí. Quer dizer, os dois episódios que contam a origem do primeiro Avatar são espetaculares, mas é uma bolha isolada dentro da série.

E pior ainda, e isso sim é um problema realmente enorme, a melhor forma que eu posso descrever o elenco de apoio da série (logo onde The Last Airbender tinha seu ponto mais forte, cada um dos outros personagens é infinitamente memoravel) é... hmm, papelão molhado, basicamente. Eu vou te dizer que se eu não tiver acesso a internet para pesquisar, eu vou ter muita dificuldade para lembrar dos personagens desse desenho.

Então o resumo da ideia é que a Lenda de Korra tem uma ideia central muito, muito boa e eu não vou dizer que desgosto da execução, mas todo o resto ao redor é... né? É um desenho ainda bem legal de se assistir, mas podia ter sido tão mais do que foi.

PRATA: Star Wars: The Clone Wars


Eu vou dizer uma coisa aqui que eu já disse no post sobre séries: a Disney não entende porque as pessoas gostam de Star Wars. Então eu vou poupar o trabalho de vários consultores ultra caros e dizer uma coisa bem simples: não é sobre a família Skywalker em particular, não é nem sobre a Força necessariamente. Jon Favreu entendeu isso com seu Mandaloriano, mas anos antes uma gangue de roteiristas liderados por David Filoni (que não por acaso foi roteirista também de Avatar: The Last Airbender de episódios do Mandalorian) já tinha entendido porque as pessoas gostam de Star Wars.

Ambientada entre os episódios 2 e 3 dos filmes, Clone Wars é uma série de 8 temporadas que mostra... bem, a guerra dos clone, duh. Mas o que isso quer dizer, na prática, é essa série trabalha com duas limitações muito dificeis:

a) eles não podem matar ou alterar drasticamente nenhum personagem chave de Star Wars, e;
b) eles tem que consertar a escrita horrível do George Lucas quando ele ainda fazia os filmes.

Sim, eu sei que é fácil esquecer isso hoje com o acidente de trem carregendo lixo tóxico que são os filmes que a Disney fez de Star Wars, mas rapaz, as prequels do Jorjão da massa são beeeeem complicadinhas de engolir também. Mas seja como for, trabalhando com essas limitações tão severas o que esse cartoon pode fazer afinal?

Bastante coisa, eu te digo.

Isso porque sem poder mexer em nenhum grande canone da franquia, Clone Wars foca justamente no que realmente importa: as pequenas coisas. Então a série é sobre o dia-a-dia dos soldados clones no front de batalha (essas são minhas parte favoritas, alias), desenvolver melhor o relacionamento do Anakin com o Obi-wan, e mostrar nas entrelinhas que o Palpatine só pintou e bordou do jeito que quis porque os jedi estavam tomados por uma arrogancia que não pode ser descrita em palavras.

Nenhuma dessas coisas é nova, vendo os filmes você se faz perguntas como se os jedi não deveriam ser mais monges do que o braço militar da Republica, ou qual é o proposito dessa guerra - se os caras querem apenas sair da Republica deixa eles sairem, fazer uma guerra pra obrigar eles a fazerem parte não parece algo "do bem" e ainda sim ninguém se pergunta isso. Ou então como caravajos ninguém percebe que o Anakin e a Padme tem um relacionamento, eles são figuras famosas demais em Coruscant pra ninguém notar isso (além do Anakin ser um péssimo mentiroso, se bem que acho isso é mais por falta de talento do ator mesmo). É esse tipo de questão que a série aborda através de uma sequencia de pequenas antologias, sempre com bastante ação e aventura, porque é isso que faz realmente Star Wars funcionar: você se importar com as pequenas coisas.

Ou, você sabe, apenas faz as coisas porque elas são divertidas e eles podem. Como um arco de episódio que o R2D2 lidera um grupo de droides em uma missão de espionagem, apenas porque é divertido.

Isso tudo adicionado ao fato que foi essa série que introduziu uma das personagens mais legais da franquia: Ahsoka Tano. O que faz ela tão legal assim, você pergunta? Bem, ela foi introduzida no começo de Clone Wars como padawan do Anakin, porque o Yoda achou que tendo uma aprendiz o Anakin se tornasse menos porra louca - é o que dizem que a paternidade faz, não?

O interessante aqui é que Ahsoka começa a série exatamente como uma versão Jr. do Anakin: impulsiva, faz as coisas antes de pensar, responde aos superiores sem pensar, enfim o pacote completo que fez varias vezes o Anakin pensar "caraca, é isso que o Obi-Wan teve que aguentar comigo? Foi mal ae, cara". Na real a Ahsoka é BEM irritante no começo.


Só que como a Ahsoka não é treinada por um jedi exatamente capacitado pra treinar alguém (definitivamente o Anakin já tem seus próprios problemas o suficiente), ela meio que tem que se virar sozinha e vai se desenvolvendo a parte naquele cenário. Então como ela não é nem doutrinada pelo código Jedi, nem influenciada pelos sussurros dos Sith (como o Palpatine faz com o Anakin), com o tempo ela meio que desenvolve uma visão crítica independente e é a única personagem que realmente consegue ver as coisas pelo que elas são: a Republica está moralmente falida e corrompida até o osso (ela é a única pessoa que não acha que é "parte do jogo" a Republica negociar com os Hut "pq é assim que as coisas são", por exemplo), e os jedi se tornaram completamente alienados do que eles deveriam ser.

Em uma história que supostamente é sobre moralismo preto e branco, bem vs mal, Ahsoka é uma personagem que tem o raro dom do bom senso e que vê através das rachaduras, ela faz as perguntas que ninguém mais naquele universo faz (e que o publico certamente se faz também). Não é por acaso que quando a Disney começou a desenhar sua ideia de séries de Star Wars, após o Mandalorian a PRIMEIRA a ganhar sua série própria é a Ahsoka, e essa não poderia ser uma decisão mais feliz por parte da Disney.

Além da própria Ahsoka, Clone Wars ainda introduz alguns personagens bastante interessantes no universo canone de Star Wars, como as bruxas Nightsisters, e não apenas trás de volta o Darth Maul (o que, por incrível que pareça, faz sentido na forma como é mostrado) como o coloca numa posição formidável para ser usado como vilão.

Enfim, para quem gosta de Star Wars, (antes do Mandalorian) Clone Wars é facilmente a melhor coisa que foi feita com a franquia desde os filmes clássicos... ok, talvez empatado com KOTOR, vá lá...

OURO: Arcane


2020: Daqui a um ano as coisas já vão ter voltado ao normal
2021: A melhor animação do ano é... de League of Legends? Que caralho?!


Pra quem não conhece o contexto, me permita explicar: imagine o 4chan, o 9gag e a sessão de comentários do G1. Todos comigo até aqui? Agora pegue essa toxidade toda, bata um liquidificador até sobrar nada senão um lodo viscoso que afugentaria os animais mutantes de Chernobyl e adicione a gosto racismo, homofobia e misoginia. Pronto, agora você pode começar a imaginar o que é jogar uma partida de League of Legends.

Então quando me disseram que a melhor animação do ano tinha nascido disso, imagino que todos vão me perdoar se eu fiquei bastante cético. Mas quer saber? É verdade. É a fucking verdade, por mais inacreditavel que pareça. Mas como isso é possível? Bem, eis aqui o truque: sendo inteligente.

Quando você tem um universo muito grande (e League of Legends tem mais de 140 personagens) e quer contar essa história para o publico leigo em outra midia, como você faz?

Bem, uma saída é começar do começo, mas isso raramente é interessante ou dá certo. Sim, filme do Warcraft, eu estou olhando pra você. Eis então o que eu sugiro fazer: dê o seu melhor tiro logo de cara.

Sério, conte a sua melhor história dentro desse universo, a mais interessante, imagine que você só tem uma bala na agulha, ou como dizia Eminem, um tiro, uma oportunidade, um momento. Porque é o que você tem, a paciência do público é um recurso extremamente limitado e o mais dificil de conseguir no mundo do entretenimento. No caso de Warcraft, por exempo, qual seria sua melhor história?

Ora, todo mundo vai te apontar que é sobre o príncipe Arthas e o Lich King e se o filme tivesse sido sobre isso, a história teria sido completamente diferente. Então no caso de League of Legends, qual é a sua melhor história?

Bem, a resposta depende de para quem você perguntar, mas pessoalmente eu diria que a personagem mais interessante do lore é a Jinx e sua relação de amor e ódio (e muita insanidade patológica) com a Vi. Agora essa é uma boa história para ser contada de um ponto de vista narrativo, e Arcane pensa da mesma forma. Ao invés de tentar "começar do começo", pegue um punhado de histórias escolhidas a dedo e costure tudo isso em um cenário steampunk com muito cuidado, atençao aos detalhes, desenvolvimento de personagem e, essa parte é importante também, um baita de um orçamento.

Sabe por que desenhos animados normalmente tem episódios de 20 minutos? Porque animação é muito cara de se fazer. Vc pode pegar uma adolescente aleatória, meter uma camera na cara dela e dizer "ah, faz qqr coisa ae" e filmar uma hora de programa pelo custo de duas paçocas e um bolinho de aipim frito (com efeito, meio que 80% da programação da Nickelodeon é feita assim). Agora fazer uma anima custa, no mínimo, três ou quatro vezes mais isso por minuto.

Então a Netflix ter aberto a carteira para fazer episódios animados de 40 minutos é uma parte importante do sucesso, porque dá tempo da série desenvolver seus personagens com calma, bom senso e tato. Arcane escolheu perfeitamente suas cartas e as desenvolve com uma segurança e qualidade narrativa que poucas vezes se viu alguém acertar assim logo de cara.

... e heh, calma, bom senso e tato para descrever uma animação de League of Legends. Esse "novo normal" de 2021 é mais louco do que nós podiamos imaginar em nossos sonhos mais loucos...

Porque quando você olha o elenco de personagens no papel, não há realidade possível em que isso deveria funcionar. Temos a Jinx que é um ripof da Arlequina, a Caitlyn que foi feita para gothics lolitas fazerem cosplays, o cientista sem noção das consequencias que suas criações implicam Jayce... não são conceitos muito complexos, nem particularmente originais na verdade. 

Enquanto o videoclipe da Jinx, de 2015, é muito legal, a verdade é que não dá muito realmente com o que trabalhar enquanto personagem

Então como, como diabos você junta tudo isso e transforma numa história de verdade com personagens de verdade?

Bem, o segredo é o que eu falei a respeito de Clone Wars: no fim do dia são as pequenas coisas que fazem você se importar, não as grandes. Eu posso agora, nesse momento, inventar um personagem e dizer que o poder dele é arremessar galaxias como se fosse shurikens (o que, obviamente, é uma coisa grande) e a sua reação será somente "pff, caguei pra ti e esse personagem tosco".

Para fazer o publico se importar de verdade não são as grandes coisas que fazem diferença, são as pequenas. Tipo tá, okay, o lore estabelecido é que a Jinx é pancada das ideias porque as pessoas acham isso engraçadinho desde a Arlequina. Certo, show de bola campeão, mas... como ela chegou nesse ponto? O que aconteceu na vida dela pra ela ser quem ela é hoje?

E essa, meu amigo, é a pergunta certa. A pergunta que faz as pessoas se importarem. Ou então, okay, o Jayce é o cientista louco because whatever. Mas supondo que existisse uma sociedade com poderes políticos atuando, quais seriam as consequencias das suas "invenções loucas"? Que impacto isso teria no mundo e como ele reagiria a isso? ESSA é a pergunta interessante a ser feita.

E é disso que eu estou falando, são as pequenas coisas que importam de verdade. Claro que você precisa dos grandes acontecimentos para mover a história pra frente, ninguém quer ver personagens sentados olhando um pra cara do outro falando durante meia hora (a menos que seja o Tarantino escrevendo, mas grandes são as chances de que a imensa maioria dos roteiristas do mundo não é o Tarantino escrevendo), mas você também precisa dos detalhes para fazer as pessoas se importarem com os acontecimentos externos.

É fácil fazer isso? Claro que não, se fosse fácil todo mundo fazia isso o tempo todo. Combinar o equilibrio entre dois estilos de narrativa (o macro e o micro)ao ponto que eles parecem uma única coisa fluída é a pedra filosofal a qual os roteiristas buscam incessantemente... e é grande parte da resposta do porque Arcane é tão bom. Acontecem coisas interessantes, a história anda o tempo todo, e você se importa com o que acontece porque você se importa com os personagens. Macro e micro fluindo lindamente como se uma coisa só, de um ponto de vista narrativo estrutural isso é uma das coisas mais elegantes que eu já vi na vida... Arcane é lindo.

Falando em lindo, a escolha do estilo de arte também é muito feliz. Quer dizer, a série é visualmente linda e isso tem uma explicação na forma com que a animação foi feita: em uma animação 3D, todos os elementos (dos personagens ao cenário) são modelados e coloridos pelo computador porque é mais barato fazer assim (é por isso que qualquer animação "taca qualquer merda é pra criança mesmo" do Discovery Kids faz animação 3D). Em Arcane é um pouco diferente, muita coisa é pintada digitalmente à mão, o que dá aquela sensação de aquarela que vemos na série. Ou então, você sabe, podemos apenas deixar tudo isso de lado e tentar uma sequencia inteira de arte conceitual em uma luta pq o artista achou que ia ficar legal e ele é um artista, o trabalho dele é literalmente ter essa sensibilidade. É, podemos fazer isso também.

Sério, essa cena parece saída de Spiderman no Spiderverso e esse é um dos maiores elogios que é fisicamente possível fazer

Dá um trabalho do cão (e é caro pra burro) em um episódio de 40 minutos? Absolutamente! Mas é o preço a se pagar pela grandeza.

Enfim, Arcane é um daqueles raros casos em que todas as estrelas se alinham e tudo dá certo. O cenário é rico é interessante, as coisas que acontecem são interessantes e a história sempre progride, você se importa com os personagens, a arte é linda e, mais importante de tudo, não exige minimamente que você chegue a 250 metros de um dos jogos mais tóxicos da internet, ou sequer saiba que ele existe.

As vezes as coisas apenas... dão certo, sabe?


Melhores do ano 2021 [ANIMAÇÃO]

THE STORY SO FAR: Essa lista se refere a tudo que eu assisti em 2021, não necessariamente o ano que lançado, e ela engloba tanto séries quanto longa metragem....
POSTADO EM:terça-feira, 8 de fevereiro de 2022
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Melhores do ano 2021 [ANIMES]

| segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022
... TO BE CONTINUED »


Essa lista se refere a tudo que eu assisti em 2021, não necessariamente o ano que a série foi lançada. Olhando no geral a lista é menor do que eu esperaria, acho que uma das coisas de ir ficando velho é que você vai ficando mais seletivo com o que escolhe para assistir.

Eu ainda lembro de um tempo que "escolher" não era fazia sentido, eu assistia o que dava do jeito que dava, seja episódios de Evangelion em .rmvb de 6MB (acho que ninguém mais hoje lembra do RMVB), a pegar dois onibus para ir em outra cidade assistir três episódios de seja lá o que for em um galpão sem ar-condicionado e achar isso o máximo (foi assim que eu assisti FLCL, alias). Se passasse algo na TV então, vish, era foguetório. Bem, nada disso importa mais e hoje eu posso escolher o que assistir e quando assistir quase simultaneamente depois que passa no Japão, não é um mundo louco esse? Definitivamente percorremos um longo caminho até aqui.

Bem, seja como for os indicados desse ano incluem também tokusatsu (pq eu não assisto o suficiente pra fazer uma lista só disso), assim como séries e longa metragens assistidos durante 2021, e os candidatos são:

  • Get your hands off Eizouken
  • The Great Pretender
  • Yu Gi Oh
  • 86-EIGHTY-SIX
  • Jujutsu Kaizen
  • Miss Kobayashi's Dragon Maid
  • Land of the Lustrous
  • Mob Psycho 100
  • Tenkuu Shinpan - High-Rise Invasion
  • The Night Warriors: Darkstalkers Revenge
  • Mobile Suit GUNDAM: Iron Blooded Orphans
  • Midori no Hibi
  • Evangelion: 1.11 You Are (Not) Alone
  • Evangelion: 2.22 You Can (Not) Advance
  • Evangelion: 3.33 You Can (Not) Redo
  • Evangelion: 3.0+1.0 Thrice Upon a Time
  • Tasogare Otome × Amunejia (Dusk Maiden of Amnesia)
  • The Big O
  • Shoujo Kakumei Utena (Revolutionary Girl Utena)
  • Samurai Sentai Shinkenger
  • Cross Ange
  • The Girl Who Leapt Through Time
  • Given
A escolha foi um pouco mais fácil do que foi com séries, acho que o meu lado weeb safado é bem mais bem definido do que meu lado seriefilo (estou patenteando essa palavra, me julgue). Mas então novamente, vamos ao Top 3 do que eu assisti em 2021!
 
BRONZE: Mobile Suit GUNDAM: Iron-Blooded Orphans
 


A coisa que eu mais aprecio a respeito da ficção é essa habilidade que ela concede de usar uma situação fantasiosa falar sobre temas complicados da natureza humana através de metaforas ou mesmo diretamente, que de outra forma seriam muito espinhosos ou pouco elegantes para se falar sobre.

Por exemplo, você pode reparar que animes raramente falam sobre guerra. Claro, um herói enfrentando um império do mal é o feijão com arroz de animes, mas eu digo no sentido militar da palavra, guerra com exercitos e aquela porra toda é muito raro, pra não dizer quase inexistente. Muito dificilmente você encontrar mangas, animes ou filmes com essa temática e suponho que todo mundo consiga imaginar as razões - para os japoneses esse assunto é profundamente doloroso e humilhante.
 
Todo mundo lembra das bombas nucleares, obviamente, mas eu diria que esse nem foi o pior legado da guerra para o Japão. O país quase morrer de um quadro generalizado de fome, cidades serem incendiadas e somado as sansões políticas e culturais que o Japão sofreu após a guerra foram igualmente pesadas. Tanto que até hoje a constituição do Japão não permite que o país tenha exército formalmente (o que foi uma das condições após a rendição na guerra), o Japão possui apenas a Força de Defesa Nacional que legalmente é meio que uma extensão da policia e que apenas em 2015 a constituição permitiu que saísse do país para ajudar em causas internacionais. Ainda sim o país é defendido por 23 bases militares americanas (com mais de 55 mil soldados), incluindo uma base aerea em Toquio.
 
Isso somado aos crimes hediondos cometidos pelo exército imperial japonês durante a segunda guerra (sério, algumas coisas tão pesadas que até os nazistas diriam "eita, pega leve filho que isso já é ir longe demais") tornam o assunto de guerra algo beeeeeem complicado de ser abordado no Japão. Serio, quando guerra evoca lembranças de coisa que os nazistas não tiveram falta de decencia humana o suficiente para fazer, é a coisa foi feia a esse nível.
 
E é aqui que entra a magia da ficção: ela permite que se fale sobre temas que normalmente seriam desconfortaveis demais para se falar, e com isso eu quero dizer que o Japão tem sim uma série de animes e mangas sobre guerra - só que com a visão japonesa do que guerra significa. E é sobre isso que Mobile Suit Gundam sempre foi. Sim, Gundam, aquela franquia do robozão gigante branco, essa mesma.
 


Nas Olimpiadas agora de 2021, a prova de escalada foi realizada sob o jugo inclemente do Gundam Unicorn (da série de 2010)

O resultado é que diferente das obras americanas onde a guerra é geralmente glorificada e exaltada como algo badass, como algo foda e admirável, em Gundam a guerra é uma tragédia que nenhum lado realmente vence no fim, é algo doloroso e horrível.
 
Eu sei que isso é estranho de se imaginar sem assistir porque Gundam é talvez uma das coisas mais assONciadas com animes, e é sobre um robozão branco de trocentos metros metendo a porrada em outros robozões de trocentos metros. E é. Mas não é tudo que essa franquia (composta por várias séries e filmes sem necessariamente relação entre si) é.
 

 
E a iteração de Gundam que foi exibida de 2015 a 2017, Blood-Iron Orphans, é uma das versões mais pesadas desse franquia. Caso o nome não tenha dado a deixa ainda.
 
Um diferencial deste Gundam para os outros animes de mecha, é como ele trabalha a questão de crianças pilotando estas máquinas. Mesmo que você não tenha costume de assistir obras deste tipo, alguma hora se você viu algo relacionado, talvez tenha se perguntado: “por que os pilotos são sempre crianças/adolescentes?”. Bem, a resposta é óbvia: para o publico alvo se identificar e comprar brinquedos relacionados. Mas Gundam é um caso que a ficção tenta justificar um motivo, e não é um motivo bonito.
 
Nossa história aqui se passa em algum ponto distante no futuro, onde um grupo mercenário em Marte usa crianças como ferramentas baratas e dispensaveis de guerra - não muito diferente do que acontece no nosso mundo na Africa. Só que nessa história as crianças se rebelam, matam os adultos que as escravizavam e ... bem, passam elas mesmas a administrar o grupo mercenário porque o que mais eles realmente sabem fazer da vida senão lutar? Somado a isso que o cenário sONcioeconomico de Marte é bem complicado mesmo para os adultos conseguirem emprego e sobreviver, que dirá um bando de órfãos que literalmente não tem outro lugar para onde ir.
 
E justamente por ser um bando de garotos que opera robos gigantes como um bando de animais que não tem mais nada a perder (pq eles são), eles acabam se destacando e sua força militar acaba sendo envolvida no grande esquema de poder politico daquela sociedade onde Marte é uma das colonias da Terra. Então a ideia geral é que BIF é basicamente como um bando de crianças mercenárias acabaram sendo usadas na guerra de indenpendencia de Marte e, como você pode imaginar, o resultado é sangrento e bastante pesado.
 
E enquanto a primeira metade da série é uma das coisas mais legais que eu já assisti em anime, é dramatico, violento, bem construído e com ação de robozões da porra fazendo coisas de robozões da porra na medida certa, a segunda metade é o que impede que a série de ter um lugar mais alto na escala.
 
Isso porque o lado político na guerra fica inchado demais, com personagens demais, objetivos demais, lados demais. Eu entendo que no papel a coisa de "estamos morrendo nessa guerra pra que, afinal?" é meio que o ponto... bem, de uma guerra... mas a primeira metade fazia isso com um foco bem mais simples e objetivo.
 
Mas ainda sim, apesar de alguns tropeços na segunda metade, sua história de como um bando de crianças-soldados mudou a história da guerra de indenpendencia de Marte foi plenamente realizada - traçando sua ascensão e queda em um cenário politicamente carregado, onde tudo tem uma segunda intenção por trás. Jogue algumas batalhas de mecha muito bem animadas, o personagem mascarado obrigatório que Gundam sempre tem que ter e um monte comercial de garage kits para vender, e você tem os ingredientes de uma ótima série.
 


Mas sério, essas porras de bonecos (que esses animes são feitos para vender, no fim) são muito lindos mesmo. 

PRATA: Jujutsu Kaizen
 


Suponho que não é realmente surpresa pra ninguém a ideia de que a cultura japonesa como um todo é muito pesada, rigida, dura. Essa é a imagem meio que automática que nos vem a mente e isso é verdade mesmo no entretenimento, toda cultura japonesa é engessada em formulas, existem modos de fazer as coisas, existem padrões a serem seguidos. Shonen, shoujo, seinen, slice-of-life, romcom, animes de esportes, cada genero é mais do que um mero rótulo dado após a obra ser criada e sim um guideline que o autor tem que ser de como fazer as coisas. No Japão existe um metodo e uma forma para tudo, e animes não exceção.

Verdade seja dita, é um espetaculo em si mesmo ver o quão criativos os japoneses conseguem operando dentro dessas formulas, mas as linhas da grade ainda estão lá do mesmo jeito. Quando você vê um shonen, um shoujo ou um tokusatsu, você sabe de antemão quais batidas serão tocadas - mesmo que elas variem enormemente entre si. Porque, como eu disse, existe um metodo de fazer as coisas, existe uma forma correta. É assim que o Japão rola. A cultura japonesa é o produto final do peso incalculável que seu povo carrega nas costas.

... mas será que é mesmo?



Ver mais
 
Porque aqui eis a coisa interessante: a cultura humana não é nada senão um organismo sempre evoluindo através das suas experiências próprias, e isso é verdade até mesmo para os animes - porque os japoneses são também pessoas, vejam só. Então toda essa sisudice, essa coisa de "é assim que se faz as coisas e ponto final", toda essa coisa de tradição rígida... não é exatamente isso que se vê nas ruas das grandes cidades, especialmente Tóquio.
 


E é aqui que entra o maravilhoso poder da juventude, pois é hora de entrar em uma cena uma nova geração que não é responsável por todas as coisas que aconteceram no passado. Eu gosto muito que o tema central de Naruto é sobre como um bando de crianças tem que carregar nas costas (e resolver) o legado de uma guerra que não foi deles, e que eles definitivamente não tem nada haver com isso. Naruto é sobre a geração de hoje resolvendo as tretas que os adultos fizeram no passado, e eu suponho que os paralelos com a realidade japonesa são bastante obvios a esse ponto.
 
Pois bem, se Naruto é sobre os jovens resolvendo as tretas de ontem, pode-se dizer que Jujutsu Kaizen é essencialmente o próximo passo nessa evolução cultural da juventude japonesa. 
 
Jujutsu Kaizen é um anime para a geração milenial japonesa que cresceu sob o peso de uma cultura milenar em suas costas, mas que se sente  mais do que isso. Essa é a geração que não se sente culpada pela guerra (porque não é mesmo), é uma geração que cresceu em um contato com o exterior nunca antes imaginado na sua história graças à internet, é uma geração que troca informações e experiências como nunca antes em sua história. Essa é a geração do hip hop, das roupas coloridas e extravagantes no centro de Tóquio, é a geração dos fabulosos Phantom Thieves sendo fabulosos because fabulosidade. É uma geração leve, uma geração sem esse peso todo no seu coração. Essa é uma geração cool.
 
É nesse ponto que entra Jujutsu Kaizen, a obra prima da geração cool. O fruto de uma geração que cresceu assistindo as sementes de liberdade criativa que vazavam das formulas fixas do manga shonen. É uma geração que conhece Dragon Ball Z e Cavaleiros do Zodiaco, mas que cresceu mesmo é lendo os personagens com mais do que uma camada de Yoshiro Togashi (Yu Yu Hakusho e Hunter x Hunter), que cresceu o manga com proposito de Naruto, uma história que quer chegar em algum lugar no sentido artistico da palavra, uma geração que aprendeu a rir de si mesma com One Punch Man e Gintama.
 
Jujutsu Kaizen é a sintese dessa nova geração de mangás shonen, o próximo passo da evolução. Claro, JK é tão shonen quanto shonen pode ser, porque a estrutura do mangá - se estripada aos seus basicos - é basicamente Naruto: um jovem otimista e dentro de coração bom tem um demonio de poder infinito se de si em uma sociedade rígida onde cada clã tem mais poderes de pessoas animezísticas.
 
Só que Jujutsu Kai é a evolução natural de Naruto, porque a coisa mais incrível do ser humano é que ele está sempre tentando melhorar e evoluir. Por exemplo, uma coisa que me incomoda em Naruto é que um ponto muito importante da série é que Naruto e o Sasuke são amigos. Discutivelmente é o ponto mais relevante da série. O problema não é esse, entretanto, e sim que eu vejo isso muito mais ser dito do que vejo acontecer, basicamente porque personagens meninos de anime tem que ter uma cintura dura e não se permitem muitas intimidades uns com os outros, é assim que o Japão é. Ou era. 
 
Então você ouve muito o Naruto falar de amizade com o Sasuke, mas você realmente viu muito pouco isso acontecer na prática porque é assim que as coisas eram feitas na época. Jujutsu Kaizen não tem esse problema: Megumi é "o Sasuke desse anime", mas esse anime não tem a mesma cintura dura no relacionamento entre os personagens que seu irmão 20 anos mais velho tem. 
 
Meguumi e Yuji são amigos sim, você sente isso sem que ninguém precise dizer isso 238 vezes. Megumi ainda cumpre a função do personagem reservado e distante, com um poder foda de um clã foda e uma história pessoal trágica, mas sem todo aquele peso anos 90 que o Sasuke tem. Ele é uma versão cool e maneira do Sasuke, sem perder a sua essencia. Pegar a essencia, corrigir os defeitos, deixar mais cool ainda. É assim que nós rolamos agora.

Outra coisa, sabe como o estúdio Pierrot fez o que pode pra cagar Naruto com fillers ao ponto que é praticamente inassistivel se você não estiver vendo uma versão editada? A lição foi aprendida e aqui é justamente o contrário: cada cena é lindamente animada como se ela fosse importante, 24 episódios que valem ouro são uma escolha mais adequada aos dias atuais do que 240 que whatever faz qualquer merda aí.

Ou então sabe quando a personagem feminina do grupo não faz nada de particularmente útil porque a abordagem de um manga shonen dos anos 90 é "eca meninas eca eca". Bem, nós não fazemos mais as coisas assim hoje. A Nobara é legal pra caralho, obrigado, de nada.
 
Pois então, agora imagine que JK faz isso com 40 anos de anime e você entende o que eu quero dizer que é a obra prima de uma geração. Jujutsu Kaizen tem coisas de Naruto, mas corrige seus defeitos e é mais cool. Jujutsu Kaizen tem coisas de Bleach, mas corrige seus defeitos e é mais cool. Jujutsu Kaizen tem coisas de Yu Yu Hakusho, mas corrige seus defeitos e é mais cool. Entende meu ponto agora?

Literalmente o ponto do anime é que nesse ano em particular eles estão tento a mais talentosa e promissora de feiticeiros Jujutsu em séculos, o que é uma departure gigante do que obras desse tipo são no sentido de "antigamente houve uma era de glória e poder e agora vivemos com restolhos desses dias maravilhosos". Não, a era gloriosa é agora, estamos vivendo os dias agora. O momento é esse e a hora é essa.

Ah, sim e quando eu digo "mais leve", eu quero dizer no sentido de livre, não de leviano. Jujutsu Kaizen não é um anime inconsequente, ele aborda temas relevantes (especialmente que nem todos os humanos merecem ser salvos, e nem todos os monstros merecem morrer) mas de uma forma tranquila que só quem sabe o que está fazendo consegue fazer. Jujutsu Kaizen sabe o que está fazendo.

Claro, o anime ainda está na sua primeira temporada e nada garante que eles não vão foder a porra toda daqui pra frente. Mas o que temos até o momento é a evolução natural de Naruto, Yu Yu Hakusho e Persona 5, na forma da voz de uma geração que é livre, leve e solta. E muito cool.

Imagine Devilman Crybaby, só que shonen e sem induzir ao suicidio por desesperança. Se isso não é potencial pra ser o melhor shonen de todos os tempos, então eu não sei mais o que poderia ser.
 


OURO: Evangelion: 3.0+1.0 (Thrice Upon a Time)
 


Okay, essa dava pra ver vindo a um milhão de milhas de distancia, né?

Bem, eu já fiz um post especifico pra esse filme falando o que ele significou pra mim então eu queria ressaltar o quanto, mas TÃO importante poder dizer apropriadamente "sayonara, subete no Evangelion".
 
Adeus Evangelion, nunca haverá outro anime como você. Haverão outros, melhores, piores, que tentam mais ou menos coisas diferentes, mas Neon Genesis Evangelion terminou e esse capitulo foi fechado. Eu suponho que nada que eu possa dizer para encerrar do que  a letra de "One Last Kiss", a música que encerra o último filme de Eva, uma música que fala justamente da despedida dessa  obra que significou tanto.



ONE LAST KISS - Utada Hikaru
 
Apesar de ter sido minha primeira visita ao Louvre
Não me impressionou muito
Porque a minha própria Mona Lisa
Eu já tinha encontrado a muito tempo atrás

Desde a primeira vez que eu te vi
Engrenagens começaram a se mover
Era um presságio de que você ia me deixar

Oh, embora você me tenha dado incontaveis
Mas, por favor, me dê mais um
Você pode me dar um último beijo?
Isso é algo que eu não quero esquecer

Oh-oh-oh-oh, oh-woah, oh-oh-oh (Oh-oh)
Oh-oh-oh-oh-oh, eu te amo mais do que você imagina

"Eu não gosto de tirar fotos"
Mas na tudo bem porque eu não preciso dessas coisas
Pois a sua imagem já está gravada 
No projetor no fundo do meu coração

Eu fingia que não sentia sua falta
Bem, acho que ambos fingimos
Afinal sabemos que começar de novo com alguém 
Seria na verdade muito doloroso

Você pode me dar um último beijo?
E vamos fazer ser bem ardente
Para eu não conseguir esquecer
Mesmo se eu quisesse 

Oh-oh-oh-oh-oh, te amo mais do que você imagina
Oh-oh-oh-oh, oh-woah, oh-oh-oh (Oh-oh)

Oh, eu finalmente entendi
Que mesmo até o fim dos tempos
Que mesmo quando eu for velho
Eu não vou esquecer de você

Oh-oh-oh-oh-oh, você nunca será esquecido
Oh-oh-oh-oh-oh, oh-woah, oh-oh-oh (Oh-oh)

Depois da brisa que o vento soprou
Tudo que me resta é a lembrança de um momento bom. 

Melhores do ano 2021 [ANIMES]

THE STORY SO FAR: Essa lista se refere a tudo que eu assisti em 2021, não necessariamente o ano que a série foi lançada. Olhando no geral a lista é menor do q...
POSTADO EM:segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022
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