Melhores do ano 2021 [ANIMAÇÃO]

| terça-feira, 8 de fevereiro de 2022


Essa lista se refere a tudo que eu assisti em 2021, não necessariamente o ano que lançado, e ela engloba tanto séries quanto longa metragem. Sim, ontem mesmo eu fiz uma lista sobre anime e essa é sobre animações em geral porque enquanto anime tecnicamente É um desenho animado também... qual é, vocês sabem que é uma coisa diferente que funciona com regras diferentes, uma filosofia diferente e tem todo um zeitgeist próprio. Então vocês entenderam do que eu estou falando, não seja essa pessoa do "mas tecnicamente..." pq ninguém gosta do cara do "mas tecnicamente" - essa dica de vida foi de graça, para as próximas arrasta pra cima e se inscreva no meu curso.

Dito isso, vamos ver então os candidatos - ou seja, todas animações que eu assisti durante o ano de 2021:
  • Avatar: A Lenda de Korra
  • Star Wars: Clone Wars
  • The Amazing World of Gumball
  • The Dragon Prince
  • Reboot
  • Soul
  • An American Tail
  • The Lion King 3: Hakuna Matata
  • Beavis and Butt-Head Do America
  • Wakko's Wish
  • The Pagemaster
  • Over the Moon
  • A Shaun the Sheep Movie: Farmageddon
  • Batman: Mask of the Phantasm
  • Raya e o Último Dragão
  • My Little Pony: A New Generation
  • Arcane
  • Wolfwalkers
BRONZE: Avatar: A Lenda de Korra


Tendo assistido The Last Airbender em 2020, uma das primeiras coisas que eu fiz em 2021 foi assistir a sua continuação. Então vamos começar tirando o elefante branco do meio da sala: Avatar: The Last Airbender é uma animação perfeita. Pronto, eu falei, tae, tá dito.

E o que eu quero dizer com "perfeito"? Bem, sempre que você assiste alguma coisa, mesmo uma que você goste muito, geralmente lhe ocorre alguma coisa que você gostaria que fosse feita diferente, alguma coisa que você mudaria pra ficar melhor ao seu gosto. As vezes nem precisa ser uma coisa grande, tipo Pacific Rim é um dos meus filmes favoritos da vida porque é a porra de robozão da porra dando com um navio petroleiro na cara de um kaiju, o que poderia ser melhor? Hã, eu faria com que houvesse uma explicação melhor do pq eles precisam usar robozões gigantes ao invés de apenas disparar misseis (um campo de força contra projeteis já resolveria a questão). Viu, nem precisa ser uma coisa grande, só um detalhezinho de nada que eu faria diferente.

Isso sendo dito, o que eu mudaria em The Last Airbender é... nada, realmente. Não me ocorre nada que eu gostaria que fosse diferente, ou melhor executado. Nada mesmo, é incrível e maravilhindo do jeito que é. Tá, pra não dizer que eu não mudaria nada naaaaada, eu gostaria de um final mais longo. Um episódio que fosse pra mostrar como ficaram as vidas deles após a batalha final.

Como eu falei do mesmo problema com o final do MCU em Avengers Endgame, como você continua uma coisa que é incrível, maravilhosa e estupefaçante no coração de todos? É uma tarefa deveras complicada, alguns diriam impossível. Mais complicado que isso ainda: muita gente vai ficar ofendida por você ao menos tentar porque o ser humano é um cabeça de mamão por natureza.

E esse foi o truque que os desenvolvedores do show se tocaram: não existe mortal pra trás, pirueta ou cambalhota que eles possam fazer que impeça a comparação de qualquer coisa que eles fossem fazer com sua obra anterior. Não tem como, é impossibiru. Então o que você faz? Super simples, não bata de frente com o ódio, use-o a seu favor o incorporando na narrativa, seja um hatebender. É uma ideia louca e ousada, mas eu tenho um fraco por ideas loucas e ousadas, saiba você.

Então o que rola nesse desenho é o seguinte: não tem como comparar Korra com Aang, e em qualquer aspecto o nanico careca sempre vai vencer. É muito fácil simpatizar com Aang: ele tem uma história trágica (literalmente todos que ele conheceu e amou na vida foram chacinados), e ainda sim tenta ser a melhor pessoa que ele pode ser. Ele não é perfeito nisso - apesar de ser um monge ele ainda é humano, mas ele tenta.

Korra por outro lado é o oposto disso, é muito difícil gostar: é uma menina impulsiva e mimada, que sempre ganhou tudo que quis na vida sem lá grandes esforços. Tudo sempre foi fácil pra ela e ela sempre teve o melhor sem dificuldade. Se alguma coisa, sua relação com a Korra no começo da série é que ela tropece num Lego e leve um tombo enquanto tá com as mãos no bolso.

E esse é o truque aqui: não é apenas a audiencia assistindo o programa que vai sempre comparar os dois, as pessoas vivendo naquele cenário também vão fazer o mesmo. O que não é sem razão, porque a Korra começa a série como uma babaquinha de marca maior.

Então o que Korra possivelmente poderia fazer para ser digna de ser colocada no mesmo nível do maior avatar (e metanarrativamente, do desenho animado) de todos os tempos? Perder tudo, simples assim. E eu quero dizer tudo mesmo: não apenas seus poderes, mas o seu próprio corpo.

Ao longo de sua jornada, Korra foi quebrada ao ponto de não restar absolutamente nada da sua pessoa. Sua alma foi dilacerada (e no caso de ser o avatar, isso não é figura de linguagem, foi literal mesmo), ela foi torturada, e passou os anos seguintes traumatizada e com dores cronicas (o que é não é uma sensação nada agradável, eu espero que você nunca passe por isso).

Ou, caso você não lembre, é assim que a terceira temporada termina:


Yaicks, isso é... pesado. Eu não lembro agora, de cabeça, de nenhuma animação onde termina com o protagonista chorando calado em uma cadeira de rodas. Talvez porque nunca foi feito...

Animextremist - Imagenes de Saint Seiya Tenkai Hen Overture

Carai Kurumada, não ferra com o meu argumento cara... CAHAM, mas prosseguindo...

Seja como for, isso também é uma coisinha que se chama "arco de personagem". Apesar de começar a série com controle de todas as dobras, Korra não realmente faz ideia do que ser o Avatar significa e definitivamente não merece ser chamada de um e todo ponto da animação e ela tem que fazer fazer essa jornada de perder tudo a aprender o que ser o Avatar significa com todo mundo chovendo na cabeça dela o tempo todo que ela nunca vai ser tão boa quanto o Aang.

Isso também é uma coisinha que se chama "arco de personagem". Apesar de começar a série com controle de todas as dobras, Korra não realmente faz ideia do que ser o Avatar significa e definitivamente não merece ser chamada de um e todo ponto da animação e ela tem que fazer fazer essa jornada de perder tudo a aprender o que ser o Avatar significa com todo mundo chovendo na cabeça dela o tempo todo que ela nunca vai ser tão boa quanto o Aang.


É uma escolha de design narrativo muito interessante, e eu genuinamente acho que é uma experiencia rica a série ser feita dessa forma. Outra coisa que eu gosto bastante nessa série é que todos os vilões querem coisas que são essencialmente boas, só que de uma forma distorcida.


Igualdade, espiritualidade, liberdade e união podem ser ferramentas do mal (e por mal entenda algo que faz as pessoas sofrerem) se forem feitos fora do equilíbrio. Essa é uma mensagem muito mais profunda do que “acredite em si mesmo”, ou qualquer merda do tipo que normalmente temos nos desenhos animados normalmente.

E enquanto tudo isso é incrível e faz o show realmente valer a pena de se assistir... não é sem sua dose de problemas. E não é uma pequena, saiba você. A história de produção do show teve vários, vário, vaaaaaaaaarios problemas com a Nicklodeon ao ponto que os produtores não sabiam nem quantos episódios eles iam poder ter ENQUANTO A SÉRIE ESTAVA SENDO FEITA. Tente escrever um livro sem ter controle de quantas páginas ele vai poder ter e depois me diga o quão bem isso se sai.

O resultado foi que a construção de mundo, em que criar um cenário interessante de fantasia foi o ponto mais forte de Avatar, foi relegada a algumas ideias de se basear na Nova York dos anos 20 na primeira temporada e... meio que termina por aí. Quer dizer, os dois episódios que contam a origem do primeiro Avatar são espetaculares, mas é uma bolha isolada dentro da série.

E pior ainda, e isso sim é um problema realmente enorme, a melhor forma que eu posso descrever o elenco de apoio da série (logo onde The Last Airbender tinha seu ponto mais forte, cada um dos outros personagens é infinitamente memoravel) é... hmm, papelão molhado, basicamente. Eu vou te dizer que se eu não tiver acesso a internet para pesquisar, eu vou ter muita dificuldade para lembrar dos personagens desse desenho.

Então o resumo da ideia é que a Lenda de Korra tem uma ideia central muito, muito boa e eu não vou dizer que desgosto da execução, mas todo o resto ao redor é... né? É um desenho ainda bem legal de se assistir, mas podia ter sido tão mais do que foi.

PRATA: Star Wars: The Clone Wars


Eu vou dizer uma coisa aqui que eu já disse no post sobre séries: a Disney não entende porque as pessoas gostam de Star Wars. Então eu vou poupar o trabalho de vários consultores ultra caros e dizer uma coisa bem simples: não é sobre a família Skywalker em particular, não é nem sobre a Força necessariamente. Jon Favreu entendeu isso com seu Mandaloriano, mas anos antes uma gangue de roteiristas liderados por David Filoni (que não por acaso foi roteirista também de Avatar: The Last Airbender de episódios do Mandalorian) já tinha entendido porque as pessoas gostam de Star Wars.

Ambientada entre os episódios 2 e 3 dos filmes, Clone Wars é uma série de 8 temporadas que mostra... bem, a guerra dos clone, duh. Mas o que isso quer dizer, na prática, é essa série trabalha com duas limitações muito dificeis:

a) eles não podem matar ou alterar drasticamente nenhum personagem chave de Star Wars, e;
b) eles tem que consertar a escrita horrível do George Lucas quando ele ainda fazia os filmes.

Sim, eu sei que é fácil esquecer isso hoje com o acidente de trem carregendo lixo tóxico que são os filmes que a Disney fez de Star Wars, mas rapaz, as prequels do Jorjão da massa são beeeeem complicadinhas de engolir também. Mas seja como for, trabalhando com essas limitações tão severas o que esse cartoon pode fazer afinal?

Bastante coisa, eu te digo.

Isso porque sem poder mexer em nenhum grande canone da franquia, Clone Wars foca justamente no que realmente importa: as pequenas coisas. Então a série é sobre o dia-a-dia dos soldados clones no front de batalha (essas são minhas parte favoritas, alias), desenvolver melhor o relacionamento do Anakin com o Obi-wan, e mostrar nas entrelinhas que o Palpatine só pintou e bordou do jeito que quis porque os jedi estavam tomados por uma arrogancia que não pode ser descrita em palavras.

Nenhuma dessas coisas é nova, vendo os filmes você se faz perguntas como se os jedi não deveriam ser mais monges do que o braço militar da Republica, ou qual é o proposito dessa guerra - se os caras querem apenas sair da Republica deixa eles sairem, fazer uma guerra pra obrigar eles a fazerem parte não parece algo "do bem" e ainda sim ninguém se pergunta isso. Ou então como caravajos ninguém percebe que o Anakin e a Padme tem um relacionamento, eles são figuras famosas demais em Coruscant pra ninguém notar isso (além do Anakin ser um péssimo mentiroso, se bem que acho isso é mais por falta de talento do ator mesmo). É esse tipo de questão que a série aborda através de uma sequencia de pequenas antologias, sempre com bastante ação e aventura, porque é isso que faz realmente Star Wars funcionar: você se importar com as pequenas coisas.

Ou, você sabe, apenas faz as coisas porque elas são divertidas e eles podem. Como um arco de episódio que o R2D2 lidera um grupo de droides em uma missão de espionagem, apenas porque é divertido.

Isso tudo adicionado ao fato que foi essa série que introduziu uma das personagens mais legais da franquia: Ahsoka Tano. O que faz ela tão legal assim, você pergunta? Bem, ela foi introduzida no começo de Clone Wars como padawan do Anakin, porque o Yoda achou que tendo uma aprendiz o Anakin se tornasse menos porra louca - é o que dizem que a paternidade faz, não?

O interessante aqui é que Ahsoka começa a série exatamente como uma versão Jr. do Anakin: impulsiva, faz as coisas antes de pensar, responde aos superiores sem pensar, enfim o pacote completo que fez varias vezes o Anakin pensar "caraca, é isso que o Obi-Wan teve que aguentar comigo? Foi mal ae, cara". Na real a Ahsoka é BEM irritante no começo.


Só que como a Ahsoka não é treinada por um jedi exatamente capacitado pra treinar alguém (definitivamente o Anakin já tem seus próprios problemas o suficiente), ela meio que tem que se virar sozinha e vai se desenvolvendo a parte naquele cenário. Então como ela não é nem doutrinada pelo código Jedi, nem influenciada pelos sussurros dos Sith (como o Palpatine faz com o Anakin), com o tempo ela meio que desenvolve uma visão crítica independente e é a única personagem que realmente consegue ver as coisas pelo que elas são: a Republica está moralmente falida e corrompida até o osso (ela é a única pessoa que não acha que é "parte do jogo" a Republica negociar com os Hut "pq é assim que as coisas são", por exemplo), e os jedi se tornaram completamente alienados do que eles deveriam ser.

Em uma história que supostamente é sobre moralismo preto e branco, bem vs mal, Ahsoka é uma personagem que tem o raro dom do bom senso e que vê através das rachaduras, ela faz as perguntas que ninguém mais naquele universo faz (e que o publico certamente se faz também). Não é por acaso que quando a Disney começou a desenhar sua ideia de séries de Star Wars, após o Mandalorian a PRIMEIRA a ganhar sua série própria é a Ahsoka, e essa não poderia ser uma decisão mais feliz por parte da Disney.

Além da própria Ahsoka, Clone Wars ainda introduz alguns personagens bastante interessantes no universo canone de Star Wars, como as bruxas Nightsisters, e não apenas trás de volta o Darth Maul (o que, por incrível que pareça, faz sentido na forma como é mostrado) como o coloca numa posição formidável para ser usado como vilão.

Enfim, para quem gosta de Star Wars, (antes do Mandalorian) Clone Wars é facilmente a melhor coisa que foi feita com a franquia desde os filmes clássicos... ok, talvez empatado com KOTOR, vá lá...

OURO: Arcane


2020: Daqui a um ano as coisas já vão ter voltado ao normal
2021: A melhor animação do ano é... de League of Legends? Que caralho?!


Pra quem não conhece o contexto, me permita explicar: imagine o 4chan, o 9gag e a sessão de comentários do G1. Todos comigo até aqui? Agora pegue essa toxidade toda, bata um liquidificador até sobrar nada senão um lodo viscoso que afugentaria os animais mutantes de Chernobyl e adicione a gosto racismo, homofobia e misoginia. Pronto, agora você pode começar a imaginar o que é jogar uma partida de League of Legends.

Então quando me disseram que a melhor animação do ano tinha nascido disso, imagino que todos vão me perdoar se eu fiquei bastante cético. Mas quer saber? É verdade. É a fucking verdade, por mais inacreditavel que pareça. Mas como isso é possível? Bem, eis aqui o truque: sendo inteligente.

Quando você tem um universo muito grande (e League of Legends tem mais de 140 personagens) e quer contar essa história para o publico leigo em outra midia, como você faz?

Bem, uma saída é começar do começo, mas isso raramente é interessante ou dá certo. Sim, filme do Warcraft, eu estou olhando pra você. Eis então o que eu sugiro fazer: dê o seu melhor tiro logo de cara.

Sério, conte a sua melhor história dentro desse universo, a mais interessante, imagine que você só tem uma bala na agulha, ou como dizia Eminem, um tiro, uma oportunidade, um momento. Porque é o que você tem, a paciência do público é um recurso extremamente limitado e o mais dificil de conseguir no mundo do entretenimento. No caso de Warcraft, por exempo, qual seria sua melhor história?

Ora, todo mundo vai te apontar que é sobre o príncipe Arthas e o Lich King e se o filme tivesse sido sobre isso, a história teria sido completamente diferente. Então no caso de League of Legends, qual é a sua melhor história?

Bem, a resposta depende de para quem você perguntar, mas pessoalmente eu diria que a personagem mais interessante do lore é a Jinx e sua relação de amor e ódio (e muita insanidade patológica) com a Vi. Agora essa é uma boa história para ser contada de um ponto de vista narrativo, e Arcane pensa da mesma forma. Ao invés de tentar "começar do começo", pegue um punhado de histórias escolhidas a dedo e costure tudo isso em um cenário steampunk com muito cuidado, atençao aos detalhes, desenvolvimento de personagem e, essa parte é importante também, um baita de um orçamento.

Sabe por que desenhos animados normalmente tem episódios de 20 minutos? Porque animação é muito cara de se fazer. Vc pode pegar uma adolescente aleatória, meter uma camera na cara dela e dizer "ah, faz qqr coisa ae" e filmar uma hora de programa pelo custo de duas paçocas e um bolinho de aipim frito (com efeito, meio que 80% da programação da Nickelodeon é feita assim). Agora fazer uma anima custa, no mínimo, três ou quatro vezes mais isso por minuto.

Então a Netflix ter aberto a carteira para fazer episódios animados de 40 minutos é uma parte importante do sucesso, porque dá tempo da série desenvolver seus personagens com calma, bom senso e tato. Arcane escolheu perfeitamente suas cartas e as desenvolve com uma segurança e qualidade narrativa que poucas vezes se viu alguém acertar assim logo de cara.

... e heh, calma, bom senso e tato para descrever uma animação de League of Legends. Esse "novo normal" de 2021 é mais louco do que nós podiamos imaginar em nossos sonhos mais loucos...

Porque quando você olha o elenco de personagens no papel, não há realidade possível em que isso deveria funcionar. Temos a Jinx que é um ripof da Arlequina, a Caitlyn que foi feita para gothics lolitas fazerem cosplays, o cientista sem noção das consequencias que suas criações implicam Jayce... não são conceitos muito complexos, nem particularmente originais na verdade. 

Enquanto o videoclipe da Jinx, de 2015, é muito legal, a verdade é que não dá muito realmente com o que trabalhar enquanto personagem

Então como, como diabos você junta tudo isso e transforma numa história de verdade com personagens de verdade?

Bem, o segredo é o que eu falei a respeito de Clone Wars: no fim do dia são as pequenas coisas que fazem você se importar, não as grandes. Eu posso agora, nesse momento, inventar um personagem e dizer que o poder dele é arremessar galaxias como se fosse shurikens (o que, obviamente, é uma coisa grande) e a sua reação será somente "pff, caguei pra ti e esse personagem tosco".

Para fazer o publico se importar de verdade não são as grandes coisas que fazem diferença, são as pequenas. Tipo tá, okay, o lore estabelecido é que a Jinx é pancada das ideias porque as pessoas acham isso engraçadinho desde a Arlequina. Certo, show de bola campeão, mas... como ela chegou nesse ponto? O que aconteceu na vida dela pra ela ser quem ela é hoje?

E essa, meu amigo, é a pergunta certa. A pergunta que faz as pessoas se importarem. Ou então, okay, o Jayce é o cientista louco because whatever. Mas supondo que existisse uma sociedade com poderes políticos atuando, quais seriam as consequencias das suas "invenções loucas"? Que impacto isso teria no mundo e como ele reagiria a isso? ESSA é a pergunta interessante a ser feita.

E é disso que eu estou falando, são as pequenas coisas que importam de verdade. Claro que você precisa dos grandes acontecimentos para mover a história pra frente, ninguém quer ver personagens sentados olhando um pra cara do outro falando durante meia hora (a menos que seja o Tarantino escrevendo, mas grandes são as chances de que a imensa maioria dos roteiristas do mundo não é o Tarantino escrevendo), mas você também precisa dos detalhes para fazer as pessoas se importarem com os acontecimentos externos.

É fácil fazer isso? Claro que não, se fosse fácil todo mundo fazia isso o tempo todo. Combinar o equilibrio entre dois estilos de narrativa (o macro e o micro)ao ponto que eles parecem uma única coisa fluída é a pedra filosofal a qual os roteiristas buscam incessantemente... e é grande parte da resposta do porque Arcane é tão bom. Acontecem coisas interessantes, a história anda o tempo todo, e você se importa com o que acontece porque você se importa com os personagens. Macro e micro fluindo lindamente como se uma coisa só, de um ponto de vista narrativo estrutural isso é uma das coisas mais elegantes que eu já vi na vida... Arcane é lindo.

Falando em lindo, a escolha do estilo de arte também é muito feliz. Quer dizer, a série é visualmente linda e isso tem uma explicação na forma com que a animação foi feita: em uma animação 3D, todos os elementos (dos personagens ao cenário) são modelados e coloridos pelo computador porque é mais barato fazer assim (é por isso que qualquer animação "taca qualquer merda é pra criança mesmo" do Discovery Kids faz animação 3D). Em Arcane é um pouco diferente, muita coisa é pintada digitalmente à mão, o que dá aquela sensação de aquarela que vemos na série. Ou então, você sabe, podemos apenas deixar tudo isso de lado e tentar uma sequencia inteira de arte conceitual em uma luta pq o artista achou que ia ficar legal e ele é um artista, o trabalho dele é literalmente ter essa sensibilidade. É, podemos fazer isso também.

Sério, essa cena parece saída de Spiderman no Spiderverso e esse é um dos maiores elogios que é fisicamente possível fazer

Dá um trabalho do cão (e é caro pra burro) em um episódio de 40 minutos? Absolutamente! Mas é o preço a se pagar pela grandeza.

Enfim, Arcane é um daqueles raros casos em que todas as estrelas se alinham e tudo dá certo. O cenário é rico é interessante, as coisas que acontecem são interessantes e a história sempre progride, você se importa com os personagens, a arte é linda e, mais importante de tudo, não exige minimamente que você chegue a 250 metros de um dos jogos mais tóxicos da internet, ou sequer saiba que ele existe.

As vezes as coisas apenas... dão certo, sabe?


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