[OSCAR 2015] MAD MAX: Estrada da Fúria (resenha)

| segunda-feira, 27 de abril de 2020

Atualmente existem duas formas de se fazer blockbuster em Hollywood: são os filmes didaticamente previsíveis criados para que mesmo a menos brilhante das plateias consiga entender (e isso seria 90% do publico nos EUA e no Brasil) ou os filmes franquias, que existem unica e exclusivamente com o intuito de se vender o próximo filme da série.

Mas nem sempre foi assim. Houve uma época (realmente doida em que as pessoas usavam uma peça de roupa chamada ombreira) em que os filmes só se preocupavam em ser legais sem partir do pressuposto que o espectador teria um colapso se cada cena fosse explicada na tela e sem que o seu objetivo fosse vender o próximo filme do seu “universo cinematográfico expandido parte 2 de uma trilogia que poderia ser contada em um filme só“. Apenas ser divertido, sabe?






Essa é a sensação que passa Mad Max: Fúria da Estrada, de ser um bom e velho filme de ação dos anos 80 – mas com o capricho e a qualidade de 2015. Permita-me um exemplo: Max, como o você já pode ter deduzido pelo nome do filme, é pirado. Alguma treta muito sinistra aconteceu no passado dele e ele tem alucinações muito doidas de dorgas manolo larilarila a respeito de uma merda muito grande que aconteceu no seu passado por culpa dele.


A beleza da coisa é: em momento nenhum o filme explica claramente o que foi aconteceu e de forma alguma a loucura dele é “resolvida”. Acostumado com o cinema de hoje em dia eu esperei a cada instante o flashback didático que contaria a história de Max e o porque nos mínimos detalhes dele ser zoadaço só que não tem nenhum, seu palpite sobre o que aconteceu com ele é tão bom quanto o meu e o filme não é sobre isso.

Mas sobre o filme então, senão sobre o Max piradão? Sobre loucura.

Não foi só o Max: o que restou do mundo todo enlouqueceu e os valores deste novo mundo são mais doidos que o Batman de patinete na neve. Esse é o tema do filme e toda sua estética e edição é frenética e insana para acompanhar esse tema. E em sua loucura o filme nos faz questionar sobre nossa própria loucura.


QUE DIA! MAS QUE LINDO DIA!

Após um holocausto nuclear o mundo inteiro se tornou uma grande Austrália: desertos mortais, criaturas mutantes que desafiam a lógica e gente tão pirada quanto. Nesse mundo sem recursos e sem esperança, a treta começa quando a Imperatriz Furiosa (Charlize Theron) decide roubar um carregamento precioso do dono da citadela local, Immortan Joe: água e novinhas férteis. Mas ninguém fode com Immortan Joe! (exceto talvez as novinhas dele, esse é meio que todo o propósito da coisa né). Então de alguma forma improvável Max acaba envolvido nessa treta MALEGNA.

E não, em nenhum momento o filme explica exatamente o que é uma “Imperatriz”, embora você possa chegar as suas próprias conclusões. Não é lindo?

Lindo é também como o diretor George Miller soube adequar a temática inadequada para os dias de hoje. As mulheres são objetificadas e tratadas como um recurso? Para ojeriza das feministas e paladinos do politicamente correto, sim. Só que os homens também. E os carros. E as arvores. Tudo, essa é a moral da coisa. Não existe discriminação quando todos são tratados igualmente como lixo.
Então os cavaleiros brancos da internet podem reclamar a quantidade de mulheres andando o filme todo semi-nuas para cima e para baixo sendo tratadas como objeto mas te garanto que você encontrará pelo menos o dobro de caras sarados nas mesmas condições – porque o cenário pede isso, essa é a tônica da coisa toda, todo o maldito ponto do filme!

E se a tônica do filme está correta, a caracterização dos personagens está mais do que acertada. Mad Max tem personagens únicos e bizarros, adequados a um mundo onde você nascer tem 74 tumores é uma raridade, tão carismáticos quanto se tivessem saído de um clássico dos anos 80. Miller seguiu a risca a regra de ouro dos anos 80 sobre como fazer personagens coadjuvantes: lhes dê uma característica marcante e se agarre a isso, fim.

Tudo que você precisa saber sobre o Comedor de Gente, por exemplo, é que ele é um gordão asqueroso e que provavelmente ele não ganhou esse nome por ajudar velhinhas a atravessar a rua. Nenhum flashback pode ter resultados melhores do que a imaginação do espectador quando atiçada na direção correta, e George Miller faz isso maestralmente.





EU VIVO! EU MORRO! EU VIVO DE NOVO!


Mas a grande sacada do filme é a tribo dos Garotos de Guerra. Que é um ponto de equilíbrio muito interessante: os mutantes meia-vida são realmente uma tribo no sentido primitivo da palavra que venera de forma religiosa a figura de Immortan Joe (o que, novamente, faz todo sentido do mundo dentro do cenário e é muito bem executado), mas ao mesmo tempo são humanos o suficiente para que você os considere mais do que meras buchas de canhão. Imagine que se entre um tiroteio e outro Star Wars tivesse uma cena dos Stormtroopers dizendo o quanto aquelas botas incomodam os pés dele ou que ele fizesse uma oração a Força apenas para nos lembrar que os caras por debaixo da armadura são gente também. Gente completamente insana, mas gente

Nesse sentido o mutante pirado Nux é de longe a melhor coisa do filme e Nicholas Hoult rouba a cena cada vez que aparece. Acredite, ele é tão legal quanto parece nos trailer. Mais até.





QUEM MATOU O MUNDO?


Por mais legais e caricatos (em um sentido bom, marcante) que Immortan Joe e seus asseclas sejam, por mais interessante e repleto de convites a imaginação que o cenário seja, por mais legal que seja ter nomes como “Fazenda da Bala” e “Terra Verde das Muitas Mães” nada disso faria a menor diferença se o filme não fosse bom. No fim tudo se resume a isso: o filme é bom?

Como o nome sugere, Mad Max é literalmente um road movie: o “cenário” do filme é o caminhão “Máquina de Combate” e o mais importante: e é pau na casa de Noca o tempo todo!

Uma versão moderna de um faroeste de comboio (aqueles que a caravana atravessava o oeste selvagem levando pau de bandidos e índios), George Miller acerta a mão e trés pés no ritmo do filme. é ação frenética e alucinada, mas que sabe perfeitamente dar o timing e criar momentum para que você se importe com as cenas (algo que Vingadores 2 errou, por exemplo, em que você desliga o cérebro em metade das cenas de ação).

Adicione a isso que o filme é muito econômico com tecnologias: as cenas foram filmadas ao bom e velho estilo Australiano  com muitos carros em movimentos e dubles colocando seus tobas na reta, pouca computação gráfica. Miller filmou no meio do deserto com pouca tela verde e algumas cenas levaram meses para ficar pronta, a qualidade final é evidente e enorme. Esse é um daqueles filmes que você PRECISA ver no cinema, e eu raramente digo isso.


Essas cenas com malucos se balançando em carros em movimento foi feita com dubles de verdade e não computação gráfica em estúdio, completamente insano!

é a catarse do cinema em que os homens são homens de verdade, as mulheres são mulheres de verdade e os calangos mutantes do deserto são calangos mutantes do deserto de verdade. é filme de ação como não se via a muito tempo – ele sabe quando ser FODA PRA CARALHO, sabe quando pausar e sabe quando respirar.

E mesmo quando o filme usa computação gráfica, como na cena da tempestade nuclear-magnética (uou!), é apenas para fazer coisas que seriam impossíveis de outra maneira. Ou seja, liberar a imaginação ao limite do deslumbre. Alias se esse filme não ganhar o Oscar de melhor fotografia eu estou louco então, porque é o deserto pós-apocalíptico mais lindo que eu já vi.

Como vitória pouca é bobagem a trilha sonora é um arregaço, o tema recorrente de ação do filme já é um clássico do cinema e por si só já levaria nas costas o clima de ação desenfreada regada a muita cocaína que o filme passa.


Faz outra piada que ela precisa de uma mãozinha!

TESTEMUNHEM!

Tom Hardy está ótimo no papel de maluco caladão, sua voz de Bane é excelente para fazer narração, mas talvez a maior critica que se possa fazer é compara-lo com Mel Gibson que nasceu para interpretar maluco zureta. Curiosamente isso não é problema porque o filme não é sobre Max (nunca foi realmente, Mel Gibson tinha menos de 100 palavras no segundo filme) realmente sendo que Nux e Furiosa (que também não é uma Tina Turner) tem o maior arco de personagens na película (dá até para considerar que eles são os protagonistas, de uma certa forma)

Entre referencias a série original (repare que os filhos de Immortan Joe são um mutante anão esperto e outro brucutu sem muita massa cinzenta, por exemplo) e cenas de ação autenticas, Estrada da Fúria não é apenas um grande filme como consegue ser melhor que os  originais.

Um filme que sabe quando explicar (no começo do filme Max é capturado pela tribo de Immortan Joe, mas é mantido vivo por um motivo muito foda dentro da ideia do cenário) e quando deixar o espectador pensar por si mesmo. Personagens que são fodas, mas não são invulneráveis (Immortan Joe é um monstro, mas ao mesmo tempo que é mostrado como apenas um homem, em um equilíbrio elegante e impressionante).


Ok, talvez um dos carros do seu comboio ser um carro de som com um mutante tocando uma guitarra que solta fogo não seja uma escolha taticamente otimizada, mas eu TOTALMENTE teria um desses se fosse um Senhor da Guerra pós-apocalíptico!

Dá para sentir como o diretor passou anos lapidando esse filme na sua cabeça (e outros tantos nos desertos australianos) para tudo ficar redondinho e é difícil apontar o que não funciona nesse filme. Violencia na medida certa, personagens na medida certa, insanidade na medida certa. As cenas de ação são insanas mas não cansam. Até o 3D funciona como ferramenta de imersão (sentir as dunas mais próximas ou mais longes ajuda bastante) e isso é algo que eu quase nunca elogio em um filme!
Não viamos um filme de ação como Mad Max a muito tempo, talvez nunca tenhamos visto. Miller conseguiu juntar o melhor dos anos 80′ com o melhor dos anos 10′,criando uma verdadeira aula de como se fazer filmes de ação.

O melhor do ano até o momento. QUE FILME! MAS QUE LINDO FILME!
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