[GAMES] LAST DAY OF JUNE (ou seus bastardos! Vocês mataram a June!)

| sábado, 27 de julho de 2019


Eu já vi jogos inspirados nas mais variadas coisas que você pode imaginar. De séries de TV (sim, Life is Strange, todo mundo notou que você assistiu Twin Peaks) a eventos históricos. O que eu nunca tinha visto, no entanto, é um jogo de aproximadamente três horas baseado em um videoclipe de 8 minutos.

Isso é novo, certamente, mas é necessariamente bom? Vejamos...


Carl e June estão em love dove mode, a vida é bela e o Sol nunca se põe, yada, yada, yada. Desculpe se eu estou parecendo pouco romantico neste momento, mas está fazendo exatamente cinco graus nesse momento e é bem dificil ser romantico quando você tem que estudar cautelosamente seus movimentos para não se descobrir. Sim, o frio não tem nada de romantico, os filmes mentiram pra você. Lide com isso.

Enfim, Carl e June estão todos pimpões, curtindo um dia de amorzinho no campo quando CRASH BOOM BANG, a tragédia acontece. Porque sério, você não achou que esse seria um jogo sobre pessoas felizes sendo felizes o tempo todo, né? A menos que você vá fazer um curta de 45 minutos sobre uma garota dormindo e nada acontece, uma história precisa de conflit... hey, Japão, volta aqui Japão, eu não estava falando sério, para Japão! Apenas para, Japão!


Enfim, aonde eu estava, além do poço de vergonha e questionamento existencial por admitir que eu conheço Sleeping with Hanako? Ah sim, felicidade.

Quem acha que um relacionamento é felicidade, é porque nunca viu um puppy punk. Tae.

Então, para surpresa de absolutamente ninguém, a mesbla bate no ventilador e uma tragédia acontece. Em um acidente de carro causado por uma criança bocaberta correndo atrás de uma bola, June vai para o vinagre e Carl fica paraplégico. E essa é a lição que tiramos aqui, jovens: nunca desvie de crianças na estrada. Nunca.

Enfim, é agora que o jogo realmente começa... o que eu agradeceria se o jogo não tivesse levado UMA HORA para introduzir essa história que eu gastei dois paragrafos (enrolando pacaraio) para contar. UMA FUCKING HORA, mas hey, quem é que está contando, né? Eu sei que não estou. Because UMA HORA. Mas enfim, seguimos.



Sobre o que é o jogo então? Bem, em um lance meio Efeito Borboleta meio Feitiço do Tempo, Carlitinho de alguma forma consegue entrar em pinturas e reviver aquele fatídico dia através dos moradores da vila, os controlando na tentativa de mudar as coisas para impedir que o acidente aconteça.

Então você de alguma forma possui o garoto da casa e revive aquele dia para faze-lo encontrar outra atividade que não envolva CORRER PARA O MEIO DA RUA ATRÁS DE UMA BOLA DE R$19,90 DO SUPERMERCADO RISUL! Malditos fornicadores enchendo o mundo de crianças retardadas, me pergunto se alguém já teve a ideia de dizer que sexo é algo horrível só para esses lazarentos pararem de por esses catarrentos do inferno no mundo ... 







Mas enfim, você resolve o problema do piá abostado apenas para descobrir que isso não resolveu porra nenhuma, agora o acidente foi causado por uma retardada que decidiu se mudar empilhando 48 caixas de mudança em um FIAT de firma sem amarrar com uma corda, aí as porra vira na estrada e o Carlzinho toma no toba, né sua frequentadora de fila preferencial? Caralho como eu odeio fila preferencial... mas enfim.

Meu ponto aqui é que você tem que repetir o dia controlando os quatro habitantes da vila até eliminar todas as coisas que vão matar essa mulher e tornar o Carlito incapaz de participar do torneio intermunicipal de Dance Dance Revolution. Outra opção teria sido ele não querer pegar a Princesa Kenny em primeiro lugar, porque ô mulher pra morrer por qualquer coisa. O caçador sai correndo atrás de um passarinho, bam ela morre. O cachorro tá solto por aí, bam ela morre. O carbono-14 decaí sua meia-vida se tornando nitrogenio-14 pela emissão de uma partícula beta, bam ela morre.



Este conceito é interessante no começo, mas logo enche o saco graças ao fato de que muitas das peças não se encaixam. O jogo é mais fortemente baseado em tentativa e erro do que qualquer processo de raciocinio real, e isso se torna destrutivo tanto para a história quanto para sua capacidade de ser um interessante jogo de quebra-cabeça/aventura. Por exemplo, a solução para a segunda causa de morte faz pouco sentido com base nas regras estabelecidas pelo jogo enquanto resolve a primeira causa de morte.

Essa tentativa e erro e a falta de uma lógica estabelecida para o mundo do jogo é exacerbada pelos longos tempos de loading e pelo fato de qualquer coisa que você fizer força a cutscene de rever as cenas do final do dia de todos os habitantes da vila, bem como a maneira como Carl e June acabam se acidentando. Depois da décima vez que eu vi aquele carro bater, eu já não era mais fisicamente capaz de sentir qualquer empatia por Carl e June. Na décima quinta eu apenas disse "You bastards! You killed June!".

Existe um debate sobre como carros autonomos devem ser programados. Em caso de ter que escolher entre não atropelar alguém e salvar a vida do motorista, quem a IA do carro deve priorizar? Bem, minha resposta é bem simples: "depende, se for para atroplear uma criança então pode até acelerar".


Mas para mim, esse nem é o pior problema do jogo: jogar o jogo como os 4 vizinhos não possui nenhuma relação direta com June. Quer dizer, as ações deles, literalmente embora inadvertidamente, causam a morte dela, mas suas motivações nunca estão ligadas à morte de June. Eles apenas estavam cuidando das suas vidas e por puro azar fizeram coisas que levaram ao batimento de botas da moçoila. 

Se esses personagens fossem substituidos por qualquer evento aleatório, não mudaria nada no jogo. Nada. Ok, eu entendo que talvez esse seja o ponto e que na vida tragédias acontecem sem razão e tudo é aleatório, Deus não existe e sua waifu não é real. Certo, eu entendo essa abordagem de "shit happens, não é culpa de ninguém", porém tudo parece apenas aleatório aqui, para um jogo focado em narrativa creio que estabelecer uma ligação entre causa e consequencia teria sido para o melhor.



Permitir que esses personagens ajudassem a desenvolver a personagem June me teria feito importar muito mais com ela. Não, pensa só, um estudo de personagem através das suas relações com os outros... ao invés de apenas coisas aleatórias fazerem ela morrer sem razão ou rima. Qual você prefere?

Pois é. Enfim, jeito que foi feito pareceu que eu deveria me importar com a morte dela porque ela era o interesse amoroso do protagonista e isso é muito fraco.






A graça salvadora desse jogo é que ele brilha artisticamente. As animações dos personagens parecem uma animação de stop-motion, e eu realmente não me importaria de ver um filme disso feito pelo estúdio Laika. Os personagens também se comunicam sem o uso de uma linguagem falada, sendo necessário linguagem corporal e pequenos grunhidos, gritos e outros sons variados. Embora a princípio possa parecer limitante, rapidamente fica que é uma escolha artistica muito acertada onde cada pequena inflexão não falada evidencia perfeitamente os sentimentos dos personagens.

A estética geral é fortemente influenciada por Vincent Van Gogh e pelo movimento artístico pós-impressionista. Ou pan parnasiano. Ou romantico fleumático. Eu sei lá, eu entendo tanto de arte quanto entendo de falar com pessoas sem querer vomitar nelas, foda-se isso. O ponto é que isso faz sentido no jogo porque June é uma jovem artista. 



Esse efeito "Van Gogh" é atingido porque quanto mais longe um objeto estiver de você, menos detalhado ele estará, aparentemente usando menos pinceladas, enquanto objetos mais próximos parecem ser pintados com mais detalhes. Isso aproveita a maneira como os jogos funcionam naturalmente, já que os objetos distantes geralmente têm modelos separados com menos polígonos, que são substituídos por modelos de mais polígonos à medida que você se aproxima. Esse é um uso muito inteligente da tecnologia para atingir um efeito artístico desejado, e por isso eu aplaudo um total de três palmas lentas.

A direção de arte deste jogo merece ser notada e mereceu todos os prêmios ganhos por esse aspecto. Mas você tem que ser um tipo particularmente especial de idiota para confundir uma ótima direção de arte com uma grande e memorável história. Exceto se você for um Youtuber, mas aí então o trabalho da sua vida é tomar um copo dágua e fazer um título "INCRÍVEL AGUA TÃO BOA QUE ME FEZ CHORAR POR TRÊS DIAS SEGUIDOS" ou qualquer hipérbole assim para coisas absolutamente normais porque é assim que as crianças de hoje em dia rolam. 



Antes de escrever este texto eu procurei algumas reviews e vi clickbaits dizendo para que você se preparasse com uma caixa de lenços e toda essa merda. A verdade é que graças as escolhas infelizes de narrativas e ao design repetitivamente frustrante do jogo, fiquei apenas com raiva ao final do jogo. Se o objetivo era ser uma versão de UP em videojogo, tudo que conseguiram foi fazer uma versão artisticamente incrível do inferno de Sisifo.

Ok, essa última gastou minha cota de referencias culturais por hoje. Eu não sei o que vocês vão fazer agora, mas eu preciso recarregar minhas energias com arte de alta qualidade. 



Eu lhes desejaria um bom dia, mas a verdade é que eu realmente não me importo.


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