[ANIMES] BLOOD C (ou quebrando a regra de dropar depois do terceiro episódio)

| quarta-feira, 17 de abril de 2019


A franquia Blood, até o momento do lançamento desse anime em 2011, contava com um longa metragem em animação, um em live action, um anime, três mangas, duas light novels e dois jogos. O tema recorrente de Blood é sobre uma caçadora de vampiros chamada Saya, vestida de colegial dos anos 50 (aquele que parece um uniforme da marinha) com uma katana e um péssimo problema de atitude. Dizer que a Saya tem uma espada enfiada na bunda sequer começa a descrever o péssimo humor da Buffy japonesa, ela faz o professor Snape parecer o descoladão da classe em comparação.



Então, Blood é sobre uma caçadora de vampiros muito badass fazendo coisas badasses. Todos comigo até esse aqui? Ótimo.

Porém, os fãs de Blood ficaram lívidos quando viram que o novo anime de Blood, Blood C lançado em 2011 era... um slice of life colegial com meninas bonitinhas fazendo coisas fofinhas.




 Com a fúria de mil NANIIIIII?!?'s. os fãs de Blood estavam indefesos e estupefatos com este novo anime. Claro que o fato do anime ser produzido pela CLAMP, um estúdio conhecido pelos seus shoujos de meninas magrelas sendo disputada por caras magrelos bonitões já era uma deixa, mas nada os havia preparado para o quão moe Blood C é durante o dia.

Digo "durante o dia", porque durante a noite, como boa heroína shoujo que é, essa Saya atrapalhada e tímida recebe a espada sagrada da sua família e vai caçar demônios. Praticamente Sailor Moon, se a Toei tivesse tomado alguns litros de tóchicos e misantropia engarrafada, porque quando chega na parte de lutar contra os demonios o anime é tão desconsoante da sua parte slice-of-life que sequer parece que está assistindo a mesma coisa, ou que sequer Saya é a mesma personagem!

Isso de se assistir parece tão errado quanto a descrição soa.

Quer dizer, como um anime pode ser 75% o bom e velho moe para menininhas da CLAMP em que Saya não dá dois passos sem tropeçar na própria fofura...


... e nos 25% restantes do episódio ser um festival de sangue e tripas como se os portões do inferno tivessem se aberto permanentemente?


Cenas de banho safadeeenhas como um anime exige em um ponto, mortes são violentas que fariam a inquisição ficar com inveja no outro.

Mas calma que piora. Porque enquanto tem esse banho de sangue acontecendo nas ruas da pacata cidadezinha de Interioropolis do Sul, o cenário simplesmente ignora esses fatos! Deus, sem mentira, em uma cena mais de 10 pessoas são estraçalhadas no meio da rua ao ponto que só sobraram os pés delas dentro dos sapatos... e no episódio seguinte é vida que segue como se nada demais tivesse acontecido. Alguém só comenta que "algumas pessoas estão desaparecendo" e isso é tudo!

Ô pessoal, a mãe de vocês não ensinou vocês a não largar os calçados no meio do caminho?!


Mas caralho, CLAMP e Producton IG, vocês não pararam um segundo para ver o quão pouco sentido essa história que vocês estão contando faz?

E não é só a incongruência que incomoda nesse anime, os valores de produção são abismalmente baixos. A escola de Saya, por exemplo, é bizarramente vazia. Na verdade, exceto pela classe dela parece que mais ninguém estudo ali. Não aparece um único outro professor que não a professora regente da classe dela, durante os intervalos não tem um único personagem de background desenhado - é como se só existisse a turminha de amigos dela na hora do recreio e todo o resto da escola desaparecesse. Puta merda, custava desenhar uns caras parados ali no fundo?

Vão fazer uma animação porca assim lá na caixa prego, pqp...

"Cara figurante ali no fundo teria custado 44 centavos" - Pai do Chris, sobre Blood C


Toda construção da animação é feita por coisas toscas assim, ou que não fazem o menor sentido  quando você as diz em voz alta. Saya vive no templo em que seu pai é sacerdote, por exemplo, tendo a mãe dela morrido no cumprimento do dever de ser uma caçadora de demonios antes dela (alias a mãe dela nem nome tem, mas enfim). Só que nem ela nem o seu pai cozinham e eles fazem TODAS as refeições no café próximo ao templo.

Mas TODAS, isso não faz sentido. Se ela acordar no meio da noite com fome ela tem que se vestir, sair de casa, caminhar uns 5 minutos e bater na porta do Café Guimauve para conseguir um lanche? Que puta coisa imprática, não tem como isso funcionar em um cenário real. Não é dado sequer um motivo pelo qual o dono do café tem tanto trabalho para cuidar de Saya e do pai dela!

E falando em lanches, puta merda também, eles só sabem desenhar café e guimauve (um tipo francês de Marshmellow), pq é a única coisa que a Saya come! Ok, não que eu faça questão de assistir "Nutricionista - the Animation", mas podiam pelo menos desenhar um pouco de variedade.

Uma dieta balanceada para começar o dia despertando o tigre em você!


Isso, é claro, para não falar das lutas. As lutas com os demonios não fazem nenhum sentido! Porque os cramulhões que assolam a cidadezinha de merda lá estraçalham humanos sem hesitar meia vez com uma frequencia que faria um filme do Robert Rodrigues parecer coisa de Sessão da Tarde, mas quando eles lutam com a Saya eles se tornam subitamente ineficientes de uma forma ridícula.

Se eu for contar quantas vezes um demônio agarra a Saya pelo pescoço mas não esmaga a cabeça dela como eles fazem sem pestanejar o tempo todo, eu certamente aprenderia alguns números novos! Sim, eu sei, é a "aura do protagonismo" tão comum em animes, mas fica uma coisa absolutamente bizarra de se assistir. 

Isso, é claro, quando o anime não quebra as próprias regras apenas pelo fator choque e para acelerar a história. Por exemplo, demônios só surgem a noite e mesmo assim o pai de Saya (que ao menos tem nome, ao contrário da mãe) consegue prever quando um cramulhão vai aparecer - isso é algo bem estabelecido desde o começo da série. Até o momento em que eles começam a aparecer durante o dia e sem aviso nenhum apenas pelo prazer de foder com a vida da Saya, só por isso.



Mais uma vez, eu não posso estressar o suficiente o quanto de coisas erradas e sem sentido tem nessa cidadezinha interiorana atacada por demônios e eu não acho que seja humanamente possível que DOIS estúdios de animação tão conceituados tenham se juntado para produzir esse cenário sem perceber o quão descumcumbelada essa joça toda é.

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... exceto que... quem disse que eles não perceberam?



Em determinado ponto do anime eu comecei a notar que tinha tanta coisa errada nessa historinha da Saya, mas TANTA coisa sem sentido que me ocorreu que tinha algo muito errado com esse anime, só que INTENCIONALMENTE errado. Foi nesse instante que eu senti as meninas da CLAMP darem uma piscadinha e sussurrarem "confia na tia ;D".

Blood C é um anime que exige confiança do seu espectador, e talvez isso seja muito a se pedir nos dias de hoje,  mas ainda sim é a única forma de assisti-lo. Com confiança. Sim, os produtores do anime estão mais do plenamente cientes de todos esses problemas que eu apontei até aqui e, mais do que isso, eles queriam que eu percebesse isso sozinho. O anime não te diz "ei, olha só, isso aqui não tá estranho demais?", não, ele segue com toda normalidade do mundo fingindo que aquela situação bizarra e insustentavel é "apenas como animes são", mas secretamente torcendo para que você descubra a piada por trás de tudo isso e se junte a eles na diversão.



O uniforme do colégio que Saya frequenta, por exemplo, com certeza é muito bonito ... mas não é um pouco imprático demais? Tipo aquela corrente é estilosa, mas não é prático ter alunos vestindo isso todo dia. Além do mais, quem já ouviu falar de um uniforme japonês vermelho e preto? 

Quando você para repara em detalhes assim, o anime apenas te responde, segurando o riso:



Blood C é um anime muito inteligente. Até mesmo a escolha de ser um anime da franquia Blood, mesmo não tendo nada em comum com os outros produtos da marca, e não um magic shoujo qualquer é muito inteligente.

E se o seu ponto de venda para atrair o publico é o nível absurdo de gore (sério, acho que esse é um dos animes mais violentos que eu já vi na minha vida), o que te mantém assistindo é a curiosidade em saber o que REALMENTE está acontecendo naquela cidadezinha. E nesse aspecto, Blood C parece muito mais com Another (embora sem episódio de praia) do que com um clone tosco de Sailor Moon.

E por sua confiança, por sua perspicácia em não desistir do anime, os criadores te recompensam com um lugar na poltrona para apreciar junto com eles o que Blood C REALMENTE é, e uma vez que você entende o que está de fato acontecendo ali as cenas de gore ridiculamente violentas ganham um aspecto ímpar de diversão pura.

Puta merda, como o gore nesse anime é divertido uma vez que você entende a piada, mas talvez seja mais divertido ainda porque é uma recompensa pela sua esperteza. Isso, claro, se você não dropou o anime depois do terceiro episódio.



BLOOD C
12 episódios + filme (Blood C: The Last Dark)
Ano 2011
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